Que modelo enerxético precisamos?

Espólio energético colonial

Joám J. Romero Durán, economista e integrante da plataforma 'Eólicos Así Non', amplía o foro de debates 'Que modelo enerxético precisamos?', organizado por 'Nós Diario' co gallo do décimo aniversario da súa empresa editora, Sermos Galiza.
A soberanía energética e o dereito a decidir sobre a geração, distribuição e consumo de energia, e Galiza carece dela. (Ilustración: Álex Rozados).
photo_camera A soberanía energética e o dereito a decidir sobre a geração, distribuição e consumo de energia, e Galiza carece dela. (Ilustración: Álex Rozados).

Finalizada a guerra fria, a pretendida hegemonia da democracia liberal animou alguns enterrar a história. Porém, a que ficou bem soterrada foi a credibilidade de hierofantes neocons como o senhor Fukuyama. A contenda global pela apropriação de recursos estratégicos volta prevalecer na agenda pública, desvendando o império da real politik de prática neocolonial, que nunca findou.

Colonialismo

O trânsito ao capitalismo teve lugar diferenciadamente por territórios. Nalguns países consistiu num processo endógeno e autocentrado, dirigido por uma emergente burguesia autóctone. A sua evolução bateu com limites internos que impediam uma maior acumulação, o que desembocou na exportação de capitais comerciais e financeiros, que induziu exógenamente relações capitalistas noutros territórios. Deste modo, a nova divisão internacional do trabalho atribuiu um papel subordinado as economias funcionalmente periféricas, que não lograriam conformar uma burguesia própria condutora dum desenvolvimento autónomo, convertendo-se em economias dependentes, em muitos casos, baixo opressão nacional articulada também nos planos político e cultural. As independências da ex-colónias não iriam alterar a essência dessas relações.

No caso galego, a carência dum estado próprio e a proximidade étnica e geográfica com a metrópole complicou a capacidade para a identificação e reconhecimento dum fenómeno colonial sui generis, que prolongou o nosso submetimento histórico através dum processo exógeno de inserção capitalista. A protoindústria, o artesanato e o sector primário foram danificados pela subordinação às novas relações de produção e o nosso comércio atlântico suspenso para satisfazer a absorvente demanda do mercado mesetário. Ademais, o nosso país padecerá severos efeitos endémicos como a desarticulação intersectorial e a emigração, como resposta ao subdesenvolvimento industrial, a drenagem financeira ou a falta de constituição duma burguesia e classe obreira próprias até bem entrado o século XX. Tudo, junto à intrusão da língua espanhola e a desvalorização da nossa cultura e tradições.

Espólio eléctrico

As relações de poder no sector internacional da energia são herdeiras das relações coloniais ou neocoloniais, nas que prevalece o espólio privado dos recursos mineiros e energéticos, que destrui a sustentabilidade dos sistemas ecológicos. 

Destarte, o modelo energético galego configurou-se em função da demanda e interesses alheios. Galiza é produtora e recetora de energia destinada numa grande parte ao mercado exterior. Segundo dados do Balanço Energético publicado pelo INEGA, em 2020 exportou o 42% dos 9.398 ktep. de energia total disponível.

O subsetor elétrico está baixo o controle dum oligopólio conformado por quatro grandes grupos: NATURGY-FENOSA de origem galega e IBERDROLA, ENEL-ENDESA e ACCIONA, que dominam perto do 70% do mercado elétrico de âmbito estatal. 

No caso galego, a carência dum estado próprio e a proximidade étnica e geográfica com a metrópole complicou a capacidade para a identificação e reconhecimento dum fenómeno colonial sui generis, que prolongou o nosso submetimento histórico através dum processo exógeno de inserção capitalista

Em 2020 Galiza gerou o 10% da energia elétrica do estado e até o 17,2% da obtida de fontes renováveis. Do total de 25.099 GWh produzidos em 2020, só 16.058 GWh foram consumidos na terra, sendo exportado o 36%. 
O investimento privado na geração renovável não resposta a necessidades próprias. Procura a externalização de custos ambientais e sociais, expatriando os lucros obtidos, sem tributar aqui, nem contribuir socialmente para compensar o custo de aquisição de gás e petróleo, dos que sim somos deficitários. Ademais e seguindo o critério da Diretiva 2009/28/CE, o contributo das renováveis atinge o 74,2%, superando ja em 2020 o objetivo do Plano Nacional Integrado de Energia e Clima 2021-2030 situado no 74% para o 2030.

Aliás, a liberalização eólica impulsa uma nova onda de colonização energética. O 34,8% da energia primaria galega já procede do vento e o consumo final galego de energia renovável apenas representa o 27,8% do total de 2.523 ktep. produzidos. Pois bem, numa Galiza com 4,3 GW de potência eólica instalada, há solicitudes em andamento por 2,1 GW, mais outros 8,9 GW concedidos, o que faria um total de 15,3 GW. Tudo sem contribuir para a geração de emprego, afetando gravemente o meio natural e hipotecando o desenvolvimento potencial do nosso rural. 

Soberania energética

A soberania energética é o direito a decidir sobre a geração, distribuição e consumo de energia, consoante os próprios interesses sociais e económicos, e Galiza carece dela. O oligopólio elétrico recebe um trato privilegiado por parte duma elite dirigente parasitária, que atua como correia de transmissão dos interesses coloniais. 

Defender um nível de vida digna para a maioria social mediante a soberania energética, bate de frente com as exigências de rendibilidade do capitalismo colonial. Mais que confiar na melhor gestão dessa servidão, compre acadar a capacidade política suficiente que permita o estabelecimento dum novo marco legal energético e duma empresa pública para recuperar os recursos noutrora expropriados, contribuindo para eliminar a exclusão energética, e para alavancar o progresso económico e social.

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