Panfletos e padres ultras na Igreja galega

Nós Diario dava há uns dias a notícia da distribuição dun panfleto nas missas dominicais duma paróquia rural da arquidiocese compostelã (Quireza, en Cerdedo-Cotobade, Pontevedra) e de outra em Vigo. Chamo-lhe "panfleto" porque, ainda que o formato seja uma oração, em realidade é um panfleto político de orientação ultra. E não o traduzo, pois não merece a pena insultar o nosso idioma com esta linguagem de retórica rança e cheiro franquista. Guarda a España de todo peligro y fortalécela frente a toda adversidad, guía a los españoles al fulgor de tu luz, protege a nuestras Fuerzas Armada, defiende a nuestras fuerzas de Seguridad, preserva la unidad de la nación y ampáranos bajo el manto de Nuestra madre Inmaculada y con la intercesión del Apóstol Santiago, patronos del pueblo español. Líbrala de sus enemigos, confunde a sus adversarios y convierte nuestra patria España en una antesala de la patria celestial. O texto expressa uma ideologia de ultradireita que não respeita a realidade plurinacional do Estado espanhol. E não é cristão porque divide no canto de unir; chamando a humilhar os diferentes. Ademais de orar mais pelas forças armadas que pelos débeis da sociedade, como fez Jesus de Nazaret. Com razão, o BNG local fez um comunicado de condena por ter "um desprezível tufo de lembrança à terrível repressão sofrida nas terras de Cerdedo" e por querer meter medo. Quando soube dele pensei que era uma expressão mais de algum dos curas de grupos ultras que estão pelo território galego; que a informação que falava dele como "vicário" dessa paróquia poderia referir-se só a um destes elementos encarregado dessa comunidade. Mas não era assim. O autor era um clérigo com um cargo muito relevante na megadiocese de Compostela: Calixto Cobo Franco, vicário episcopal de Compostela para a zona de Pontevedra desde há décadas e vicário paroquial da sua igreja mais importante, a de Santa Maria, que ademais atende essa pequena paróquia de Cerdedo. Isto pareceu-me particularmente grave; porque, ainda que pela informação que pude recavar as manifestações deste padre não tenham sido até agora as de uma pessoa claramente ultra, é difícil compreender que se difunda um texto assim sem uma ideologia afim. E fá-lo um padre que tem a confiança especial dos seus sucessivos arcebispos. Grupos ultra Em declarações a Nós Diario, dito vicário diz que simplesmente colheu a pregaria de Radio Maria; gostou-lhe, viu que outros padres também a empregavam, e pareceu-lhe bem difundi-la, pois "é uma oração por Espanha, mas podia ser por Nicarágua ou Ucrânia" já que só invoca a Maria "contra os terroristas" (!). Os grupos ultra-católicos de ideologia filo-fascista nos quais estão alguns padres que atendem paróquias por Galiza adiante, sobretudo na diocese compostelã, são fundamentalmente os que venhem dos Kikos/Comunidades Neocatecumenais, muito apoiados por João Paulo II, e doutros mais novos como os Hacunas, fundados para a Jornada Mundial da Juventude (JMJ) de 2013 e ligados ao Opus; ou grupos de rapazes e moços adoutrinados pela Comunión Tradicionalista Carlista –grupo de ultradireita vinculado a Vox–, com berros como "Viva Cristo Rei!". Todos muito presentes nas afervoradas hostes da passada JMJ em Lisboa. Estes seminaristas, depois de ordenados padres andam de sotana e bonete, como os curas dos anos 40-50 do passado século, como vimos num vídeo recente de YouTube numa cerimônia na catedral de Oviedo. A chave dessa ideologia espalhada no clero galego novo está na formação recebida no Seminário de Compostela; empuxada desde há anos pelo seu Reitor (Carlos Álvarez) e, sobretudo, pelo seu Padre espiritual (Ricardo Vázquez). O Papa mandou fazer uma visita canônica para questionar a formação dos que ele chama "rígidos", que causam mais mal que bem nas comunidades cristãs Isto não é algo excepcional nos seminários espanhóis, nos quais inça esta rígida ideologia. Por isso, o papa Francisco mandou fazer uma visita canônica a estes seminários para questionar a formação dos que ele chama "rígidos", que causam mais mal que bem nas comunidades cristãs. Numa recente entrevista ao semanário católico Vida Nueva nos 65 anos da publicação falava o papa do perigoso que é quedar no passado: "A água estancada é a primeira que podrece". Por isso: "Os grupos vinculados a ideologias de direitas são os mais perigosos". Sobre esta rigidez ultra dos padres novos diz: "Reaccionam assim porque tenhem medo, e esse medo não os deixa andar […] Por outro lado, essa coiraça esconde muita podrémia. Tive que intervir por isso nalgumas dioceses de vários países […] Detrás desse tradicionalismo descobrimos problemas morais e vícios graves, dobres vidas... Não gosto da rigidez porque é uma mau sintoma de vida interior". Não é de estranhar que grupos espanhóis ultra como Hazte oir façam constantes ataques a este papa desde os portais de Infocatólica e Infovaticana.