Em Serralves e com projeto de Álvaro de Siza

A nova casa de Manoel de Oliveira

No próximo 24 de junho inaugura casa Manoel de Oliveira, a Casa do Cinema, sob um projecto do Arquiteto Álvaro Siza Vieira.

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photo_camera Manoel de Oliveira

Integrada nos espaços da Fundação de Serralves, casa Manoel de Oliveira representa, segundo podemos ler no web da Fundação, "um novo polo de referência no domínio do cinema e das imagens em movimento".

Além de uma exposição permanente, de um centro de documentação e de sessões de cinema que permitem um acesso regular à obra de Manoel de Oliveira, a Casa do Cinema apresenta uma programação de exposições temporárias, ciclos de cinema temáticos e monográficos, retrospetivas, conferências, edições e programas educativos, através dos quais promove diferentes possibilidades de aproximação ao cinema contemporâneo, no âmbito de uma reflexão alargada sobre a arte do nosso tempo.

A Casa do Cinema dispõe de duas salas de exposições, livraria e espaços de trabalho

A Casa do Cinema dispõe de duas salas de exposições, livraria e espaços de trabalho situados nos dois pisos da construção existente, acolhendo o novo edifício um auditório de 59 lugares, o arquivo, espaço de investigação e salas do serviço educativo, às quais se acede através de uma longa galeria aberta com vista panorâmica sobre o jardim envolvente.

A primeira exposição será dada a conhecer no mesmo dia da inauguração e intitula-se Manoel de Oliveira: A Casa. A exposição incide sobre as múltiplas representações da casa no cinema do realizador, tendo por foco o filme Visita ou Memórias e Confissões (1982). Produzido numa altura em que Oliveira, já septuagenário, se viu forçado a abandonar a casa onde habitou com a família durante mais de quarenta anos, com a determinação de só ser apresentado postumamente, Visita estava predestinado a um estatuto paradoxal: filme de balanço, de memórias e confissões, onde o cineasta recorda o passado ao mesmo tempo que discorre sobre as suas convicções cinematográficas. Visita é também um filme onde se antecipam muitas das realizações — de resto, a parte mais substancial da obra — que, inesperadamente, estavam ainda por vir. O tom é marcado pela despedida (de um lugar, da própria vida), mas o filme acabaria por ser mais profético do que testamentário.

Na exposição, podemos ainda ler na apresentação, encontramos “a mais eloquente expressão da importância que o espaço da casa assume no cinema de Manoel de Oliveira

Na exposição, podemos ainda ler na apresentação, encontramos “a mais eloquente expressão da importância que o espaço da casa assume no cinema de Manoel de Oliveira, e que se desdobra nas muitas outras casas que povoam a sua obra” sejam “aquelas que dão para a rua, como em Aniki Bóbó (1942) e A Caixa (1994) ou que, pelo contrário, enclausuram no Convento (1995) os diabólicos dilemas da intimidade de um casal”.

Quer por servir de motivo para um retrato social do país e uma inquirição do estado do mundo, quer para instituir a construção biográfica do autor como espaço de derivação e centro de gravidade de toda a sua obra, ou mesmo para abrir portas para o questionamento do ato de filmar e da natureza do cinematográfico, são muitas as casas que será possível visitar nesta exposição aberta a público a partir de 25 de junho e no ciclo de cinema que a acompanha.

Eis algumas delas. A casa-teatro da farsa burguesa em O Passado e O Presente (1972), a casa-prisão de Benilde ou a Virgem Mãe (1975), as duas casas rivais que precipitam a tragédia em Amor de Perdição (1978) ou os desenganos românticos de Francisca (1981). As casas arruinadas que, com vista para os prósperos solares vinhateiros do Douro, atiçam a erótica social em Vale Abraão (1993) ou comportamentos incendiários em O Princípio da Incerteza (2002). A casa-palco de Mon Cas (1986), onde o cinema é compelido a enfrentar-se teatralmente a si próprio, ou a casa-túmulo de O Dia do Desespero (1992), onde o realizador teatraliza a sua identificação com Camilo Castelo Branco. A casa-navio de Um Filme Falado (2003), a casa-ilha de Party (1996) ou a casa-mundo, asilo de alienados em A Divina Comédia (1991). A casa de onde se foge em O Gebo e a Sombra (2012) ou onde inevitavelmente se regressa em Je rentre à la maison (2001). O estranho caso dessa casa, simultaneamente origem e fim, que, a meio caminho entre recordações e ruínas, é percorrida entre Viagem ao Princípio do Mundo (1997) e Porto da Minha Infância (2001).

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