Opinión

O “galego” é o “português da Galiza”

“A miña língua é o galego, non o portugués”. Esta frase, que podemos pôr na boca dos que defendem que o “galego” é uma língua independente da portuguesa, está dita em correcto português: plenamente portuguesas são as palavras a, miña, lingua, é, o, galego, non, o, portugués.

Claro que está escrita num sistema ortográfico que não é o usado habitualmente para a língua portuguesa. Mas o feito de esse texto estar plasmado nesse sistema ortográfico não modifica a sua identidade linguística real. Seria igualmente português se estivesse representado, por exemplo, no alfabeto morse, ou no alfabeto árabe em que foram escritos os textos aljamiados, ou no alfabeto fonético internacional.

Os textos aljamiados

O caso dos textos aljamiados castelhanos e portugueses pode ser esclarecedor: aparecem escritos no sistema gráfico arábico por causa da situação ambiental em que os autores se encontravam, apesar de ser abertamente inapropriado: baste ter em conta que o alfabeto árabe só pode representar 3 vogais (e normalmente nem sequer isso faz, pois o habitual é representar só as consoantes). Mas não por isso os textos aljamiados deixam de ser textos plenamente castelhanos ou portugueses, e, de feito, como tais se editam hoje, portanto transcritos a um sistema ortográfico latino.

Algo similar acontece nos nossos tempos na Galiza com o sistema ortográfico mais divulgado: o galego da normativa ILG-RAG é, na realidade, uma espécie de “português em aljamia”.

Galego: o português falado na Galiza

            Quando falamos de “português da Galiza” não nos estamos referindo a uma língua diferente da realmente falada por todos os galegos galego-falantes. Essa língua, em qualquer da suas variantes dialectais ou gráficas, já é português. A língua da rádio e da televisão galegas, a língua dos vendedores do mercado, a “língua galega” que se ensina nas escolas da Galiza, a língua dos académicos da RAG nas suas reuniões..., tudo isso é simplesmente “português da Galiza”.

O anómalo do caso está em que é um português que parece querer negar a sua genealogia real, por causa sobretudo da sua apresentação gráfica, que obscurece o seu estado genuíno e tem consequências negativas. Mas, mesmo assim, não deixa de ser “português da Galiza”. O caminho e o espelho e alguém não deixam de ser português por escreverem-se camiño e espello e alguén.

Na verdade, não há problema em seguir empregando a denominação “língua galega” para o português falado na Galiza. Mas é óbvio que esse uso tende a levar a uma interpretação errada do seu significado: como se fosse uma língua independente do português. Também o “castelhano” usa esta denominação geograficamente restrita, mas no mundo é conhecido como “língua espanhola”, e a língua italiana, quando ainda não existia Itália como entidade política, foi denominada frequentemente “toscana”.

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