Opinión

Venezuela de braços abertos

A morte prematura de Chávez e a continuação da revolução com Nicolás Maduro à frente disparou os ataques contra o povo venezuelano.

Houve um tempo em que a Venezuela era como qualquer outro país da América Latina. As notícias que chegavam à Galiza faziam-no através da imensa comunidade galega expatriada que fugiu da miséria e da repressão. A ignorância a respeito da sua política ou o desconhecimento do nome do seu presidente, até, significavam que a Venezuela era um país normal segundo o padrão de pensamento único imposto após o fim da URSS. Como a Costa Rica ou o Panamá, era um outro lugar no mapa. Desse grupo do que, nas escolas, apenas estudávamos a capital e já. A matança do Caracazo, a revolta militar falida de 1992 chegaram apenas como um eco distante. Mas a vitória de Hugo Chávez em 1999 mudou tudo. Quando o novo presidente —do que asinha ficamos a saber o nome— enveredou polo caminho do socialismo, o chavismo converteu-se no epítome do mal governo, da extravagância, do desafio. Aquilo, é claro, não aumentou a informação. O que aumentou foi o ruído.

Da redução da fome e da desnutrição, da criação de um dos maiores parques de vivenda pública do mundo, das políticas de emprego e segurança social, da modernização do país, da extensão da sanidade pública ou da imensa campanha de alfabetização nunca soubemos. Tampouco das inúmeras eleições que o chavismo foi ganhando. Aplaudiu-se, porém, o golpe de Estado de 2002 que colocou no poder, por umas horas, o chefe da patronal. A imagem que se dava era, em todo caso, a de um regime alinhado com um “eixo do mal” oportunamente recuperado polos ideólogos do Século Americano. Aquela política de desinformação constante foi a resposta do imperialismo a um projeto que põe no centro as pessoas e a melhora das suas condições de vida, e não os lucros das companhias que pagam as campanhas do poder. E que, portanto, desafia a lógica do grande capital e das suas ramificações geopolíticas e pode servir de referência para outros processos de emancipação no mundo. Mesmo a ALBA, como projeto regional solidário, foi assim entendida como ameaça direta à dominação desse mesmo padrão quase indiscutido. Quem apontava com o dedo acusador não eram outros que os Estados Unidos e a União Europeia (com destaque para um Reino de Espanha que insiste em ser metrópole), ambos projetos de agressão e saqueio com interesses e capacidade para agir em todo o planeta.

A morte prematura de Chávez e a continuação da revolução com Nicolás Maduro à frente disparou os ataques. A agressiva política de desinformação converteu-se em guerra mediática e as jogadas de acosso no xadrez geopolítico transformaram-se em bloqueio económico, sequestro das reservas de dinheiro do país e promoção de diversas vagas de violência política para provocar o divórcio entre a população e o governo. A aparição de Juan Guaidó de dentro da cartola dos EUA e a UE não é mais que o último capítulo, desesperado e ridículo, da trama. As provocações televisionadas desde a fronteira colombiana à procura de qualquer reação de Caracas vão na mesma linha: instalar uma guerra civil que permita ao imperialismo impor a sua lei no país. O compromisso da Venezuela com a paz e a normalização da vida, por cima destas agressões e mesmo das centenas de vítimas deixadas por essa violência induzida significa, neste cenário, um compromisso certo com a resistência, uma negativa a entregar a revolução e os seus logros essenciais.

O papel do internacionalismo é, por isto mesmo, mais importante do que nunca. A própria revolução mantém permanentes esforços para tecer cumplicidades e laços de solidariedade. O mais recente movimento, que culmina anos de trabalho nessa direção, foi a celebração em Caracas, em janeiro passado, do Encontro Mundial contra o Imperialismo, e o chamado aos povos do mundo a criar estruturas de coordenação de iniciativas em apoio aos povos —não só o venezuelano— agredidos polo imperialismo. Na Galiza, organizações de solidariedade, políticas, sindicais e sociais vêm de dar um importante passo nesta direção, com a constituição do capítulo galego que se irá coordenar diretamente com o resto de seções deste espaço. A humanidade necessita-o, mesmo que haja quem o negue.

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