Opinión

Dos referendos

Os referendos, obrigatórios ou opcionais, representam umha forma de democracia directa de grande interesse político, junto com as iniciativas legislativas populares e diversas modalidades de revogaçom de cargos públicos, sem menoscabo das instituiçons clássicas da democracia representativa. 

DEMOCRACIA DIRECTA

Os referendos, obrigatórios ou opcionais, representam umha forma de democracia directa de grande interesse político, junto com as iniciativas legislativas populares e diversas modalidades de revogaçom de cargos públicos, sem menoscabo das instituiçons clássicas da democracia representativa. Este ponto de vista alicerça em dous tipos de argumentos relacionados ambos com umha maior participaçom da sociedade na vida política.

"Fazer apelo à consulta popular mediante o correspondente referendo é unha forma de reduzir a desviaçom que se manifesta entre as preferências da cidadania e as dos grupos politicos que dim representá-la".

Dumha parte, fazer apelo à consulta popular mediante o correspondente referendo é unha forma de reduzir a desviaçom que se manifesta entre as preferências da cidadania e as dos grupos politicos que dim representá-la.

De facto, com frequência, os principais grupos políticos que operam nas instituiçons representativas da soberania popular defendem posicionamentos quase idênticos entre si e à vez distantes dos anelos populares, constituindo os membros desses grupos umha sorte de “classe política”.

Umhas vezes essa discrepáncia das preferências populares obedece simplesmente à vontade dos políticos de impulsionarem os seus próprios interesses materiais; outras a motivos mais opacos (e por isso mais perigosos) que se apresentam como razóns de prestígio ou status. Aznar, por exemplo, argumentou que o seu apoio à invasom do Iraque baseava-se no desejo de “tirar Espanha do recanto da história” (“sacar a España del rincón de la historia”).

Teoricamente, nos países de democracia parlamentar hai mecanismos, bem é verdade que de alcanço limitado, para subsanar esta discordáncia entre as preferências de representantes e representados. Os cidadáns podem manifestar a sua disconformidade com a situaçom e podem, nas seguintes eleiçons, tentar introduzir através do voto alteraçons no quadro político. Nom obstante, algumhas consequências das decisons que entretanto tiverem sido tomadas contrariando as promesas eleitorais podem ser irreversíveis.

Além disso, na altura das novas eleiçons os votantes som obrigados a escolher um entre o conjunto de programas partidários que englobam mui diferentes temas e a partir desse momento só lhes resta confiar em que, caso triunfarem, os seus candidatos nom atraiçoarám as promesas eleitorais.

"Deitemos agora umha olhada ao exemplo da Suíça, onde houvo entre 1848 e 1997 um total de 316 referendos. Num 36% dos casos o resultado da consulta diferiu da opiniom maioritária do Parlamento". 

Deitemos agora umha olhada ao exemplo da Suíça, onde houvo entre 1848 e 1997 um total de 316 referendos. Num 36% dos casos o resultado da consulta diferiu da opiniom maioritária do Parlamento. Bruno Frey, notável economista político e nom por acaso cidadám da Confederaçom Helvética, ao examinar esta questom polo miúdo pom em destaque que, no caso dos cantóns suíços, os estudos econométricos revelam unha correlaçom positiva entre o protagonismo das instituiçons da democracia directa e o rendimento por habitante. Esta correlaçom positiva também se verifica entre democracia directa e moral fiscal, para nada dizer do facto de essas instituiçons contribuírem a acrescentar as liberdades, aspecto que valeria a pena considerar como um fim en si mesmo. Conclusons semelhantes poderíam ser tiradas da análise do que acontece noutros espaços políticos, como Austrália e alguns estados dos EUA, nomeadamente Califórnia, em que vigora a prática dos referendos.

Em segundo lugar, o referendo proporciona informaçom às persoas concernidas e estimula a comunicaçom entre os diversos posicionamentos em confronto. É útil portanto perspectivar esta figura com umha aproximaçom orientada ao processo e nom aos resultados. O referendo nom se esgota no acto pontual da consulta popular porque hai um antes e um depois da votaçom: o debate que precede a consulta serve para modelar preferências, desvendar posicionamentos minoritários, pôr de relevo as raízes das discordáncias, isto é: todo o que haverá que tomar em conta quando se estudem os ajustes a realizar na fase post-referendo. Com certeza, é mais razoável afirmar que no confronto político entre ideologias distantes fraguam e cimentam socialmente genuinas instituiçons democráticas do que ver no amplo consenso entre os grupos políticos um requisito para o ajeitado funcionamento dessas instituiçons. A maiores, os referendos colocam os grupos concernidos (“classe política” em primeiro lugar), perante as suas próprias responsabilidades. Vejam-se senom os obstáculos que se ponhen à pretensom dos nacionalistas vascos e cataláns de realizar consultas populares nas suas respectivas naçons.

CRÍTICAS E RESERVAS

As reservas e críticas ao emprego do referendo como forma de democracia directa podem ser condensadas en tres pontos. O primeiro di respeito ao argumento de muitos votantes nom estarem preparados para realizar umha escolha entre proposiçons que apresentam aspectos técnicos complexos.

"No referendo espanhol sobre a permanência na OTAN o realmente significativo nom foi que triunfasse o sim, senom que a percentagem de votos em contra fosse muito mais elevada que a percentagem de escanos parlamentares pertencentes às formaçons políticas que propugnavan o nom"

A isto poderia responder-se: a ) todo sistema democrático toma as preferências dos indivíduos como normativas, longe de qualquer paternalismo; b) as decisons que se adoptam nas consultas populares referem-se a aspectos básicos, remetem a juízos de valor assentes nos esquemas axiológicos próprios de cada persoa; c) nom se entende por qué o cidadán médio haveria de estar menos qualificado para tomar decisons do que os burocratas e os políticos (até poderia arguir-se que os políticos, polo seu tipo de trabalho e as formas de promocionarem na “profissom” estám mais fora da realidade que os cidadáns); e d) resulta mais doado realizar umha escolha num campo concreto da vida social e despois de um processo de debate, do que optar entre partidos e programas globais avaliando a probabilidade de os programas ganhadores se efectivarem. O segundo ponto crítico poderia resumir-se na afirmaçom de que os grupos de interesses bem organizados e com poder económico exercem umha influência desmesurada nos referendos e, em última análise, som capazes de decidir os resultados das consultas populares.

Talvez, mais o problema nom se pom nestes termos, dado que o poder económico sempre e em todo lugar se transmite nalgunha medida à esfera política, inclusive nas ditaduras.

Do que se trata é de saber que tipo de mecanismos institucionais som mais vulneráveis à influência desses grupos de pressom e aqui os dados empíricos nom jogam a favor da crítica ao sistema de referendos, já que, além do suíço, nom é difícil achar exemplos bem  ilustrativos: no referendo espanhol sobre a permanência na OTAN o realmente significativo nom foi que triunfasse o sim, senom que a percentagem de votos em contra fosse muito mais elevada que a percentagem de escanos parlamentares pertencentes às formaçons políticas que propugnavan o nom, e isso apesar de todas as manipulaçons que se produzirom na altura. O mesmo, ainda que em menor proporçom, aconteceu com a recente consulta a propósito da ratificaçom do Tratado da Uniom Europeia, aprovada no conxunto do Estado espanhol com o 76,7% dos votos emitidos e um 42% de participaçom eleitoral (na Galiza, apesar das aparências, o comportamento foi similar).

"Os custos a considerar som apenas os custos adicionais derivados de utilizar os referendos, porque as formas alternativas de adopçom de decisons, através da maquinária dos partidos e o jogo dos parlamentos, tambén exigem recursos materiais e humanos". 

A actual situaçom do Tratado da Uniom corrobora o nosso ponto de vista. Depois de umha esmagadora maioria no Parlamento Europeu (500 votos a favor, 137 em contra e 40 abstençons), o Tratado foi rejeitado nos referendos francês e holandés, enquanto em diversos Estados membros da Uniom Europeia se tomou a decisom de aderir ao Tratado via parlamentos estatais, precisamente por desconfiarem os principais grupos políticos dos resultados que deitariam as consultas. O caso da Alemanha é curioso, todo parece indicar que a opinión maioritária dos cidadáns nom concorda com a dos políticos, mais estes podem amparar-se no facto de a constituiçom da RFA excluir as consultas populares mediante referendos, sem dúvida por essas consultas evocarem um tempo de plebiscitos legitimadores de um regime ditatorial (como, por certo, também acontecia na Espanha de Franco). Note-se, no entanto, que quando regimes desse teor baixam a guarda e convocam un referendo afrouxando o controlo politico da populaçom, podem perdê-lo, como aprenderom à sua costa os generais golpistas do Uruguai ainda nom hai muito. E nom devem confundir-se os referendos realizados em países em que existem liberdades democráticas formais, em Estados descentralizados a todos os níveis da estrutura política espacial, com convocatórias populares de tipo plebiscitário, impulsionadas desde os próprios Governos centrais em favor dos grupos que detenhen o poder.

Também non julgamos que este instrumento da democracia participativa funcione adequadamente quando se leva a extremos tais que acaba por trivializar-se. Em 1990, por exemplo, os habitantes de Los Angeles forom chamados a umha consulta em que tinhan de realizar um centenar de escolhas sobre assuntos díspares e num tempo máximo de dez minutos. Interessa lembrar, porém, que no Estado de Califórnia triunfou recentemente umha consulta popular a favor da revogaçom do Governador, pertencente ao Partido Democrata, hegemónico nesse Estado, que vinha sendo mui criticado pola sua gestom política.

O terceiro ponto crítico apoia-se na ideia de os referendos resultarem custosos. Ora bem, mesmo se assim for, antes de emitir um juízo em firme, haveria que cotejar os custos com os benefícios, já comentados, desta forma de consulta popular. De outra parte, os custos a considerar som apenas os custos adicionais derivados de utilizar os referendos, porque as formas alternativas de adopçom de decisons, através da maquinária dos partidos e o jogo dos parlamentos, tambén exigem recursos materiais e humanos. Além disso, sempre cabe agrupar vários temas por referendo, realizar a consulta popular em dias feriados e pedir a colaboraçom e participaçom cidadá para o melhor controlo e cómputo dos resultados, o que nom parece difícil de conseguir precisamente por este género de consulta popular suscitar a adesom dos grupos sociais directamente concernidos. No fim de contas, em países em que o ensino geral básico está generalizado, na era da revoluçom informática, os custos dos referendos som assumíveis e tendem a reduzir-se.

No que à Galiza diz respeito, ainda que agora a reforma do seu Estatuto foi adiada, parece necessário nom demorar mais o debate sobre a introduçom de esta modalidade de democracia directa no nosso ordenamento jurídico-político.

Este artigo foi publicado, sem assinar,  em 2005 no Boletim  nº 10 de Esculca.

Ramom L. Suevos

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