Opinión

Main Street

Da curiosa forma tripartida em que se organizava o passeio da Alameda compostelana nas décadas de 20 e 30 do passado século

Da curiosa forma tripartida em que se organizava o passeio da Alameda compostelana nas décadas de 20 e 30 do passado século, deixou Carvalho Calero testemunho  saudoso  no seu romance Scórpio. Num lateral --ouvimos também contar a D. Ricardo-- passeavam viúvas e seminaristas. No outro as chamadas “modistillas”. No centro os estudantes. Por onde passeavam as poucas mulheres que na altura estudavam na Universidade é algo que ignoro.

Como ignoro se esta  era  – seminaristas excluídos--  a organizaçom habitual do passeio noutras vilas e cidades galegas. Sei que nom era assim no Ferrol provinciano de finais dos 50  e princípios dos 60, os anos do meu ingresso  na  vida adulta. Passeio havia, por suposto, e era na artéria central da cidade, umha via conhecida com o pouco original nome de Rua Real. Ali íamos à tardinha moças e moços percorrermos a rua para cima e para abaixo, umha e outra vez. Nom com ánimo de fazer exercício e prepararmos o estómago para ceia. Nom. Íamos ali, e ali passeávamos, com a juvenil ansiedade de estar onde os outros estavan, de participarmos numha ocupaçom colectiva que, se nom colmatava íntimas e imperiosas apetências, tinha polo menos no seu favor oferecer modestas diversons que disfarçavam as carências mais urgentes: falar com amigos, ler a publicidade gratuita dos filmes de estreia,  comer castanhas e, havendo sorte, ao dar a volta, fazer olhinhos com a rapariga que se escolhera para tal fim no caminho de ida. Namoros fugazes que algumha vez  terám encontrado, noutros  lugares, a maneira de crescer. Assistiam a este espectáculo, sem a escusa da idade, os senhores do casino, encerrados como peixes atrás dumha grande vidraça.

Como centralidade parece querer designar-se un conglomerado que abrangeria amplos sectores e se definiria por nom ser de direitas nem de esquerdas, por nom estar contra ou a favor da auto organizaçom e a autodeterminaçom.

Eles e nós acantoados na bolha luminosa da rua central da mais proletária das cidades galegas. Sabendo dos conflitos do extrarrádio mas ignorando ainda que a tensom que germolava na margem nom tardaria em mandar para o baú da história aquele ir-e-vir em círculo. O que aconteceu definitivamente na segunda metade da década de sesssenta, quando a oposiçom ao regime e a incipiente, mas apaixonada, luita contra a opressom nacional ocuparom o núcleo, o centro, das inquietudes da mocidade mais desperta.
Lembro isto porque nos últimos tempos observo que com frequência se introduz no debate social a noçom de centralidade (como traduçom para a nossa língua do inglês main stream) num sentido que me evoca ilusons adolescentes e me suscita interrogantes. Nom sei se porque nom acabo de entender bem o que se pretende designar com o conceito ou porque nom está mui claro qual é o significado que se pretende atribuir-lhe.

Eufemismo da direita

Descarto que se trate de designar um hipotético centro político (eufemismo com que a direita se refere a si própria) ou que se utilize como noçom afim ao conceito gramsciano de hegemonia. 

Com centralidade, ou corrente principal como por vezes tamém é traduzido, parece mais bem querer designar-se um conglomerado ideológico que abrangeria amplos sectores sociais e se definiria por nom ser de direitas nem de esquerdas, ou por ser de direitas e de esquerdas. E, se introduzirmos na definiçom (ou na indefiniçom) o eixo nacional, por nom estar contra ou a favor da opressom, por nom estar contra ou a favor da auto organizaçom e a autodeterminaçom. A centralidade seria portanto um espaço político que as formaçons partidárias e coaligaçons electorais deveriam pôr na mira da sua estratégia.

Varias perguntas

E se é assim, penso que, como nacionalistas que nom desdenhamos o papel da representaçom institucional mas nom queremos ver reduzida a acçom política a umha simples estratégia de catch up (apanha do máximo de votos mediante estratégias calculadamente ambíguas no plano ideológico), devemos fazer-nos várias perguntas. Estas podem ser algumhas. 

Que resultado derom as medidas legislativas no plano dos valores com que o PSOE de Zapatero se esforçou em ganhar o favor da corrente principal para ocultar a sua renuncia a desenvolver politicas socialmente avançadas? 

Que deveria fazer esse pequeno regato que forma o exíguo 5% da cidadania de Israel que se declara contrário às atrocidades sionistas?

Quê provocou que CiU  tivesse que ceder a centralidade política na Catalunha a um grupo (ERC) que, embora nom exactamente outsider até esse momento, tivera importantes fracassos eleitorais nas décadas anteriores e nunca escondera o seu carácter radicalmente independentista? 

Que deveria fazer esse pequeno regato que forma o exíguo 5% da cidadania de Israel que se declara contrário às atrocidades sionistas? Sumar-se  ao aluviom, aplaudir o massacre e condecorar os assassinos para confluir com a corrente principal?

A corrente principal

E aqui, em casa, que fazemos? Renunciamos ao ideário laicista e republicano porque os inquéritos revelam que a monarquía espanhola goza de apoio maioritario entre os povos do reino? Juntamo-nos ao coro de entusiastas da integraçom na Uniom Europeia e abençoamos todos os males que provoca por ser essa a atitutude socialmente maioritária? Incluímos na bençom as perniciosas consequências da criaçom da  euro-zona? E quando nos setenta começamos a vislumbrar os problemas que suscitaria essa integraçom, que deveríamos ter feito? Calar a nossa discordáncia? E quando nos noventa economistas como Paul Krugman alertavam dos problemas que acarretaria a criaçom da euro-zona deveríamos ter ignorado os avisos porque essa nom era a opiniom da corrente principal?

Distinguir táctica e estratégia

Como antes dixem, deve ser que nom entendo bem o conceito. No entanto, se o que se quer significar é que na acçom política nem todo pode ser intervençom social na rua, que cumpre distinguir táctica e estratégia (e interrelacionar ambas), que ser firmes na defesa dos principios nom implica o recurso fácil a retóricas maximalistas, que é imperioso que a vida underground agrome e floreça e que a periferia faga sua a rua central, plenamente de acordo. Mas com um propósito. Nom remedando aquele provinciano andar em circulo dos meus anos adolescentes.

Ramom L. Suevos é professor aposentado da USC

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