Opinión

Marinha Semente

Tal dia como hoje, de há 4 anos, a nossa vida mudou totalmente. Às 00:09 de 12 de agosto de 2017 nasceu Marinha, a nossa filha, e já nada foi igual ao que antes era. A partir desse momento refletimos sobre aspetos da vida nos que antes pouco ou nada tínhamos reparado como a criança, os cuidados ou os afectos. Começamos a questionar, também, outros muitos sobre os que achávamos que tínhamos certezas que agora temos de pôr a prova. 

A nossa filha é mulher, portanto, a criança em igualdade com valores feministas, e tentando fugir dos quase inevitáveis estereótipos de género, torna-se uma necessidade. Apesar de ser uma criança urbana, queremos que mantenha um estreito vínculo com a contorna natural, que aprenda com e da natureza, que aprenda que ser ambientalista é algo mais que separar o lixo. Queremos que aprenda a ser crítica, mesmo com os seus progenitores, queremos que saiba ser ela própria ao tempo que seja quem de reconhecer o valor do coletivo e da comunidade, queremos que se crie sendo consciente de ser galega e como criança galego-falante. Tudo isto, como exemplo de alguns dos muitos objectivos vitais que ponderas, com a responsabilidade que implica a maternidade e a paternidade.

Mas criar e educar nunca é uma tarefa exclusiva de mães e pais, criamos e educamos em comunidade, sempre. Nunca estamos isolados. Temos que ter em conta a contorna completa das nossas crianças porque é sempre fundamental para o seu desenvolvimento. Um dos campos mais importantes desta contorna, evidentemente, é o do ensino e a escola, mas entendida no seu sentido mais alargado, isto é, nom só importam as aulas senom toda a comunidade educativa. Principalmente as e os iguais, as e os companheiros de turma, as crianças com as quais a nossa filha passa mais horas ao longo do dia, umas e outras ajudam-se e modelam-se mutuamente. Também que o professorado, as mestras e mestres, partilhem os nossos valores, que podam marcar esse roteiro que antes mencionamos. E finalmente, o resto de mães e pais, que desejem também construir comunidade e um projeto de ensino galego.

Todos estes valores garante-os uma iniciativa social como as escolas de Ensino Galego Semente, onde a língua galega -entendida como internacional- é veículo transmissor da riqueza da interculturalidade ao mesmo tempo que se valoriza a nossa cultura e história. Um espaço construído também polas próprias crianças que aprendem a autorregular-se e a ser livres e responsáveis quando tomam decisões. Um espaço sem machismos, laico, tolerante e democrático onde as crianças  aplicam a aprendizagem mútua colaborando umas com as outras. Um espaço inserido na natureza onde através de uma pedagogia transformadora aprendem valores ambientais, jogam, e interagem com o ambiente natural. Um espaço para fomentar a sua criatividade e o pensamento crítico, para poder abordar os problemas ou questões de diferentes focagens. Um espaço que em menos de um mês dará um salto muito ambicioso quando o novo ano académico começar na nova escola das Moas, onde pais e mães trabalham voluntariamente e sem descanso para poder torná-la uma realidade, também nestes dias de agosto.

A nossa Marinha cumpriu o seu primeiro ano acadêmico completo na Semente, e como resumo só podemos dizer que é uma criança muito, muito feliz e galego-falante. Agora, no verão, lá por onde vai, transmite os valores e ensinanças da Semente com uma naturalidade que é mesmo abraiante. Esta manhã na cama comentou-me, sobre uma criança castelhana que conheceu a semana passada: "Papá, Paulo, digo Pablo, chama-lhe 'huesos' às carabunhas das olivas". Ontem num bairro popular de uma das grandes cidades galegas, a sobrinha duma amiga começou a falar galego com ela. Sua tia estava realmente surpreendida pois nunca tal ouvira à criança de sete anos, a nena com toda a naturalidade respondeu-lhe "Tia, é que eu nom sabia que havia crianças que falavam galego, por isso nom o falo".

Como já comentamos no artigo anterior, nos próximos 40 anos, se queremos resultados diferentes, teremos que ter estratégias diferentes, a Semente é uma delas, e é de esperar que num futuro próximo seja o grande exemplo para o ensino geral e público de Galiza.

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