Opinión

É tão bom o turismo, como dizem?

Se falarmos em turismo não podemos ficar apenas no número de pessoas que servem a outros vindos doutros territórios ou na “riqueza” gerada, medida através o PIB. Também não podemos ficar no muito sacanas que são os jovens independentistas catalães da ASA ou no muito bacana que é a população galega interpelada pelos meios oficiais tanto públicos como privados.

Mesmo se falarmos em turismo há que falar de tudo o que acarreta: bom e mau, porque quanto à pergunta do título, não pode ter uma única resposta. Convém explicarmos as bondades espalhadas e visarmos as maldades silenciadas, contrabalanceando-as.

O turismo é uma atividade económica que emprega uma determinada quantidade de pessoas, podendo atingir por volta de 10 por cento dos ocupados totais e que a partir deste facto, num momento em que as autoridades da política económica (governos galego e espanhol, CE e BCE) deixam por fora o objetivo de criar emprego, há que proteger e cuidar, não ajuizando qualquer outro aspecto do mesmo. Por exemplo, não se fala do efeito expulsão para criar trabalho noutros sectores ou que parte destes postos de trabalho não são devidos à atividade turística, senão a outras atividades produtivas ou de ócio dos próprios residentes (comer ou dormir fora de casa por questões laborais, tomar uns copos com os amigos, etc.). Sacralizarmos esta classe de postos de trabalho pressupõe a continuação de Ence na ria de Ponte Vedra ou a instalação de minas e canteiras em zonas protegidas.

Paralelamente com o pressuposto do emprego encontramos o da riqueza medida através do PIB. Aliás das argumentações utilizadas na cima, poderíamos acrescentar a fraqueza do próprio indicador em termos de precisão contável e de medição do bem-estar das pessoas e do progresso económico. Quanto ao primeiro dizermos que o PIB, por exemplo, não tem em conta o trabalho das mulheres (são hegemonicamente mulheres) nos cuidados dos familiares dependentes, mas sim computou os serviços pagos a empresas por limpar a costa e o mar galegos após o desastre do Prestige, para mais do imenso trabalho dos voluntários. Respeito ao segundo, cada vez existe um consenso maior sobre a necessidade de utilizar outros indicadores para estimar o bem-estar das pessoas e o progresso económico.

Para além de mais o turismo tem escasso impacto induzido em termos de produção e emprego (a indústria manufatureira produz 3 vezes mais empregos indiretos que o sector hoteleiro). Ainda o emprego que cria o turismo é de baixos soldos (6 por cento inferiores na Galiza com dados de 2011 a respeito das remunerações médias, que chegam a 10 por cento nos serviços de comidas e bebidas), elevada taxa de temporalidade, baixa produtividade ou reduzido investimento em inovação e formação. Toda a gente está desejando servir turistas!

Contudo ainda não se falou das externalidades negativas do turismo: destruição de habitats, paisagens e recursos; saturação, privatização do espaço público e dos bens comuns; mudanças no mercado habitacional; impacto sobre os serviços de proximidade; especialização de áreas da cidade; etc. Cidades como Santiago sofrem de todos estes males sem que os residentes das mesmas usufruam qualquer compensação. Deslocar-se a pé pelo centro histórico ou pelos passeios das ruas de entrada de peregrinos à cidade é um suplício, o mesmo que realizar qualquer atividade quotidiana, como é comprar no mercado de abastos. A cidade histórica deixa de ter vizinhas e vizinhos para acolher turistas em albergues e residenciais. As lojas de toda a vida: mercearias, retrosarias, livrarias, ferragens, etc., transformam-se em lojas de souvenirs. Os bares e restaurantes viram vendedores de comida de plástico: pizzas, massas, hamburguers; assumindo a vizinhança os custos da limpeza e da gestão do lixo gerado. De utilizarmos o indicador ambiental da criança (Francesco Tonucci, La città dei bambini): “se na cidade olhamos crianças a brincar e caminhar sozinhas, significa que a cidade goza de boa saúde, se na cidade não vemos meninos, significa que está doente”, Santiago obteve o pior resultado. Embora na zona velha de Compostela quase não há carros e os que entram estão pacificados, é um deserto de crianças, o modelo de turismo deve ter qualquer coisa a ver.

As soluções da teoria económica para estas deseconomias negativas concretizam-se nos âmbitos privado e público e também em soluções conjuntas como a proposta pelo teorema de Coase. As soluções privadas são de dois tipos, umas que tentam internalizar estes custos sociais através de fusões a aquisições empresariais, e outras que incidem nas convenções sociais tentando mudar os comportamentos mais negativos das pessoas. A proposta do teorema de Coase ao igual que as fusões e aquisições assemelham inviáveis no âmbito do turismo. A primeira devido os grandes custos de negociação, dado o elevado número de afetados e de geradores das externalidades, e no campo privado pela própria organização e atomização do sector.

Ficam apenas as soluções públicas dos tributos, dos subsídios ou da criação de mercados, isto é, a venda em leilão aos prestadores de serviços turísticos de autorizações. Novamente, as duas últimas opções não parecem muito factíveis. Desta maneira, ficamos com a fixação de taxas como a solução económica mais adequada contra as deseconomias do turismo.

Contudo outras medidas também são possíveis. O sector precisa de uma regulamentação mais estrita quanto à ordenação dos espaços públicos, ao número e à qualidade dos estabelecimentos, à proteção das zonas históricas e dos espaços naturais, à pedagogia para os turistas na linha de “não faças aos outros o que não queres que te façam a ti” e sobretudo de pedagogia para nós próprios para aprendermos a valorizar o nosso e não achar que tudo o que vem de fora sempre é melhor.

Comentarios