Opinión

Leninismo e libertaçom nacional (I)

A questom nacional no marxismo tem sido objeto de umha importante produçom teórica que parte dos fundadores, Karl Marx e Friederich Engels, se bem é preciso afirmar desde já que nom foi um tema central em nengum deles, nem é a marxista a primeira corrente de pensamento interessada no assunto. 

A questom nacional no marxismo tem sido objeto de umha importante produçom teórica que parte dos fundadores, Karl Marx e Friederich Engels, se bem é preciso afirmar desde já que nom foi um tema central em nengum deles, nem é a marxista a primeira corrente de pensamento interessada no assunto. De facto, foi precisamente a partir de Lenine, e coincidindo com o desenvolvimento da fase imperialista do capitalismo ao longo do século XX, que se produzírom os mais importantes contributos para a teoria e para as luitas nacionais nas correntes revolucionárias marxistas.

"Foia partir de Lenine que se produzírom os mais importantes contributos para a teoria e para as luitas nacionais nas correntes revolucionárias marxistas".

Indo brevemente aos inícios, devemos indicar a parcial compreensom de algumhas importantes implicaçons do fenómeno nacional e do nacionalismo polos primeiros teóricos marxistas e das outras correntes da esquerda no século XIX. Achamos que o relevo da questom nacional parte da origem mesma do capitalismo como modo de produçom, na medida que a exploraçom, a opressom e o domínio de umhas naçons sobre outras constituem um aspeto da mesma totalidade social e universal: a exploraçom, opressom e domínio que se dá no interior de umha formaçom social concreta dentro do modo de produçom capitalista.

Isto é assim porquanto hoje sabemos bem que o próprio desenvolvimento histórico do capitalismo nom poderia ter chegado ao grau de desenvolvimento global atual sem a funçom de intercámbio desigual e sem o espólio ilimitado verificado polas grandes potências capitalistas europeias em relaçom às suas colónias. Foi isso que permitiu o avanço tecnológico e económico necessário para a universalizaçom do capitalismo como processo histórico (1) a partir dos estados-naçom centrais em que surgiu o mundo burguês.

Marx e Engels: A visom a partir do capitalismo avançado europeu

É um facto bem conhecido o nascimento histórico do estado-naçom como forma jurídico-institucional ao serviço da expansom mercantil e industrial no ascenso da burguesia como nova classe dirigente, no seu longo processo de afirmaçom que lhe permitiu ultrapassar os limites das velhas relaçons de produçom. A substituiçom primeiro factual e depois legal da relaçom salarial entre patrons e trabalhadores, o sustento jurídico do estado de direito como legitimaçom das novas normas impostas à divisom do trabalho e a necessária abertura de um mercado único estatal ajudam a entender o avanço, a par e passo, das novas formas de capitalismo e as novas formas estatais ao seu serviço.

É essa constataçom por parte dos próprios Marx e Engels no coraçom da Europa desenvolvida do século XIX (Inglaterra) que os levou a afirmarem essa nova forma estatal como facto progressivo nom apenas na própria Europa (onde a sua Alemanha natal sofria um atraso socioeconómico refletido no atraso na constituiçom da nova naçom unificada), mas no resto do planeta. O otimismo com que ambos autores enxergavam a expansom do modelo central europeu a outras regions do mundo, como a Ásia ou a América, explica o apoio sem reservas à colonizaçom indiana por parte do imperialismo británico, à anexaçom territorial mexicana por parte do jovem capitalismo norte-americano ou mesmo a sua errada avaliaçom da figura e do papel de Simón Bolívar. Na sua visom, a imposiçom de modelos capitalistas avançados consoante o padrom europeu levaria as naçons instaladas em modos de produçom atrasados à conformaçom de proletariados capazes de liderar futuros processos revolucionários.

"Sendo indubitável o caráter internacionalista do marxismo desde a primeira hora, tanto Marx como Engels combatêrom as posiçons cosmopolitas no seio da I Internacional. Quer dizer, internacionalismo nom significa indistinçom ou dissoluçom das identidades nacionais".

Já no caso do continente europeu, o critério de Marx e, sobretodo, de Engels enfrentárom contradiçons entre a condena dos chamados “povos sem história”, considerados incapazes de protagonizar a sua própria emancipaçom e, por isso, condenados à desapariçom pola inexorável imposiçom do correspondente Estado-Naçom (2), portador do capitalismo; e os que, incapazes até aí de construir o seu próprio Estado, protagonizavam processos que ambos vírom com aberta simpatia (3). Para além do seu “tradicional” apoio ao movimento nacional polaco, especialmente significativo vai ser o que dam ao independentismo irlandês. Significativo, nom só porque contradi a sua visom mecanicista em relaçom às colónias americanas e asiáticas, mas também porque ambos vivem em Inglaterra, conhecendo de perto esse conflito nacional (4), cada vez mais acirrado conforme avança o século XIX, atingindo formas insurreccionais por parte do movimento feniano irlandês.

As sucessivas recomposiçons do capitalismo inglês após cada crise, a absorçom do movimento cartista polo sistema, a integraçom dos outrora combativos sindicatos para se limitarem à luita por melhorias salariais, as votaçons maioritárias contra os partidos operários na década de 60… Engels identifica o significativo progresso e integraçom do proletariado inglês no capitalismo como resultado do espólio das colónias. Daí ao apoio expresso à “colónia branca” irlandesa, é só um passo que ambos camaradas nom demorárom a dar com total clareza, avançando para posiçons de maior coerência com os objetivos libertadores do marxismo.

Implacável frente ao cosmopolitismo e às teses proudhonianas de desprezar qualquer conflito nacional como “preconceito antiquado”, Marx escreve a Engels em 1866, comentando a discussom num encontro entre diferentes correntes operárias em Londres, no qual alguns franceses defendiam a dissoluçom em pequenas comunas associadas como alternativa à conformaçom dos modernos estados: “Os ingleses rírom muito quando comecei dizendo que o nosso amigo Lafargue e outro que acabavam de abolir as nacionalidades, nos falavam em ‘francês’, quer dizer, um idioma que nom compreendiam 9/10 partes do auditório. Depois sugerim que por negaçom das nacionalidades, Lafargue parecia entender, muito inconscientemente, a absorçom delas na exemplar naçom francesa” (5).

Afinal… os operários tenhem pátria?

Nom é objeto destas linhas abordarmos a posiçom de Marx e Engels na questom nacional, mas achamos importante termos situado alguns traços gerais, porquanto som a base sobre a qual Lenine irá construir a sua própria teoria e prática. É por isso que acho útil abordar, nem que seja de maneira breve, a famosa polémica sobre a posiçom de Marx frente à relaçom entre os operários e a pátria.

"Entre as limitaçons objetivas que marcárom as abordagens de Marx e Engels ao problema nacional, haverá que ter em conta que, se bem a sua obra aponta a tendência do movimento do capital para a concentraçom e para a mundializaçom, nengum deles assistiu ao surgimento dos monopólios e da fase imperialista".

Diferentes autores e movimentos políticos, sobretodo ao longo do século XX, interpretárom de maneira diversa a sentença marxiana, contida no Manifesto Comunista, segundo a qual “Os operários nom tenhem pátria”.

Segundo Horace B. Davis, estudioso das relaçons históricas entre socialismo e nacionalismo (6), houvo quem a interpretasse a afirmaçom de Marx como “pura retórica sarcástica”. Porém, levando-a a sério, admitiria três interpretaçons:

   1. A incapacidade do proletariado para desenvolver qualquer cultura nacional devido à posiçom de extrema exploraçom que padece no capitalismo.
    2. O proletariado só “terá pátria” quando tomar o controlo do Estado através de um processo revolucionário, daí que “ainda nom tenha pátria”.
    3. A classe operária é por definiçom “internacional”, portanto é irrelevante a sua adscriçom nacional. Este argumento iria ao encontro da visom defendida por Bakunin, nom por Marx, no seio da I Internacional.

A interpretaçom que figermos tem a sua importáncia, porquanto afeta a necessária distinçom entre internacionalismo e cosmopolitismo. Sendo indubitável o caráter internacionalista do marxismo desde a primeira hora, tanto Marx como Engels combatêrom as posiçons cosmopolitas no seio da I Internacional, como de maneira breve apontamos nos dous exemplos acima reproduzidos. Quer dizer, internacionalismo nom significa indistinçom ou dissoluçom das identidades nacionais.

É certo que a assunçom das luitas nacionais tem em Marx e Engels limites em parte dependentes da sua “crença” no padrom de desenvolvimento “progressivo” consoante o modelo europeu até a revoluçom socialista. Daí deriva também a sua preferência polos grandes espaços estatais como articulaçom do internacionalismo entre povos industrializados avançados. Porém, também é certo que a evoluçom do pensamento de ambos teóricos da revoluçom os levou a umha cada vez mais firme assunçom das luitas dos povos oprimidos e em nengum caso defendêrom a desapariçom das naçons como caraterística da futura sociedade comunista.

Entre as limitaçons objetivas que marcárom as abordagens de Marx e Engels ao problema nacional, haverá que ter em conta que, se bem a sua obra aponta a tendência do movimento do capital para a concentraçom e para a mundializaçom, nengum deles assistiu ao surgimento dos monopólios e da fase imperialista.

Depois de Marx-Engels e antes de Lenine: Entre o chauvinismo e a insuficiente compreensom do facto nacional

O grande contributo de Lenine foi, sem dúvida, ultrapassar as carências dos autores que, seguindo o marxismo, tentárom realizar umha atualizaçom da compreensom e do programa revolucionário no plano nacional. Karl Kautsky, Otto Bauer, Gueorgui Plekhanov, Rosa Luxemburgo, Leon Trotsky, Josif Staline… com muito diferentes graus de compreensom e interpretaçom do facto nacional na nova fase imperialista, coincidem ao protagonizar análises insuficientes ou desfocadas por diversas causas. Do chauvinismo kautskista, que o leva, junto ao conjunto da II Internacional, a defender a burguesia do seu próprio país em 1914; até o mecanicismo cosmopolita de Plekhanov, pai dos marxistas russos, que acredita na progressiva “eliminaçom das diferenças nacionais”; o determinismo economicista de Rosa Luxemburgo, que nega qualquer viabilidade nacional ao seu próprio povo, o polaco; ou o culturalismo de Bauer e os austromarxistas; assim como o ecleticismo de Trotsky, a caminho entre o culturalismo e o economicismo; e a rígida receita staliniana, caraterizada pola insuficiente distinçom entre o nacionalismo da naçom opressora e o nacionalismo da naçom oprimida (7).

Sem entrarmos no desenvolvimento das diferentes visons sobre o assunto no campo do marxismo, sim queremos salientar que foi em debate com esses autores e autoras, entre outros, assim como na escola prática da trajetória histórica de 25 anos de militáncia revolucionária, que Vladímir Illitch perfilou a mais madura teorizaçom marxista para o capitalismo monopolista desenvolvido diante dos seus olhos ao longo do primeiro quartel do século XX.

Notas

1 Transnacionalización y desnacionalización. Ensayos sobre el capitalismo contemporáneo. Rafael Cervantes et alii. Ed. Tribuna Latinoamericana. Buenos Aires, 2000.

2 Com destaque para os povos eslavos do sul (checos, eslovacos, bósnios, sérvios, eslovénios…) acusados de colaboracionismo com os Impérios Czarista e austríaco contra os levantamentos liberais-progressistas na própria Áustria, Hungria, Polónia e Itália.

3 Numha carta a Kautsky em 1882, referindo-se à Polónia (submetida ao Império russo), escreve: “…Libertar-se da opressom nacional é a condiçom básica de todo desenvolvimento saudável e livre… Nom é tarefa nossa dissuadirmos os polacos dos seus esforços para ganharem as condiçons do seu desenvolvimento futuro, ou dizer-lhes que de um ponto de vista internacional a sua independência nacional é questom completamente secundária, quando, ao invés, é a condiçom de toda colaboraçom internacional”.

4 Para além da intervençom no movimento operário inglês, com importante presença irlandesa, lembremos que a companheira de Engels era dessa nacionalidade.

5 Correspondência de Marx a Engels. Londres, 20 de junho de 1866.

6 Nationalism & Socialism. Marxist and labor theories of Nationalism to 1917. Horace B. Davis, 1967.

7 Um estudo divulgativo dos diferentes autores e autoras marxistas em relaçom à questom nacional pode ser consultado numha obra bem conhecida na Galiza: Patria ou Terra Nai? Ensaios sobre a Cuestión Nacional, de Michael Löwy. Edicións Laiovento, 1999.

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