Limite ao preço dos alimentos?

Desde março de 2022, o índice de preços dos alimentos da FAO cai 17,9%. Segundo o AMIS Market Monitor, voltaram a níveis pré-guerra, mas ainda se mantêm altos, acima dos níveis de anos anteriores. Os stocks permanecem ajustados nos mínimos dos últimos anos, o que, junto à redução das colheitas do cereal ucraniano, mantém a instabilidade de preços. Os preços dos fertilizantes também caíram por baixo dos seus máximos, mas seguem altos, deteriorando a rentabilidade agrícola. O clima adverso no hemisfério sul dizimou as colheitas de trigo e outros cultivos. A queda de preços dos produtos básicos desde o verão de 2022 freou o dos elaborados. Contudo, ainda que menos da metade do aumento de preços do trigo se transmitira ao consumo, a repercussão da atual rebaixa de preços é muito menor. O mês de janeiro fechou com uma subida interanual dos preços dos alimentos e bebidas não alcoólicas em Galiza dos 15,6%, o maior nível em três décadas. Segundo o Ministério de Agricultura, Pesca e Alimentação, a suba começou a finais de 2021 provocada pela quebra das redes logísticas após a pandemia e o incremento dos custos energéticos e fretes marítimos, agravados pelo conflito na Ucrânia. Controlo de preços Neste panorama, surge a proposta que reclama do governo espanhol limitar os preços duma canastra de entre 20 e 30 alimentos básicos. Ou a de fixar margens de lucro máximas a produtores, intermediários e lojas. Há precedentes históricos bem-sucedidos de controlo de preços em circunstâncias excepcionais como, por exemplo, as aplicadas pelos EUA durante a I e II Guerra Mundial, a Guerra da Coreia e a do Vietname. Reputados economistas seguiram a defender estes controlos ante restrições da oferta para evitar escaladas de preços, mas desde os anos setenta não voltamos a assistir a um cenário inflacionário como o de hoje. A ortodoxia económica dominante refuta este controlo porque distorce a suposta capacidade dos mercados para a livre assinação de preços. Porém, hoje segue a existir controlo de preços por parte de diversas economias desenvolvidas em mercados como os da eletricidade, as telecomunicações ou os derivados do petróleo, ou também, nos alimentos básicos, nomeadamente em países em desenvolvimento. Agrobio-diversidade, soberania e segurança alimentar são fulcrais à hora de garantir uma alimentação de qualidade a preços acessíveis. Sarkozy estabeleceu em 2011 um acordo voluntário com as principais distribuidoras francesas para limitar os preços dos alimentos. O Panier des Essentiels consiste numa canastra de produtos básicos elegidos pelos supermercados, que se comprometem a vender a preços acessíveis. Porém, o acordo deixava fora o pequeno e mediano comércio, favorecendo a pressão sobre as margens dos produtores. Facto, ante o que o governo teve que reagir estabelecendo limitações ao poder de mercado da distribuição em 2019. Segundo a consultora Refinitiv, do London Stock Exchange Group, estamos ante um cenário de aumento das margens da grande indústria alimentar. A baixa dos custos energéticos vai contrastar com a estabilidade nos preços dos seus produtos, e salvo uma possível contida recessão nos EUA e na UE, prognostica-se um aumento da procura. Por contra, a distribuição obterá nos EUA margens operacionais quatro vezes menores, virando o investimento financeiro em favor das transnacionais transformadoras do setor alimentar. Cultivo tradicional Em Galiza, a queda do índice de produção da indústria alimentar e do peso do sector primário, além do défice exterior, aumenta a nossa dependência e vulnerabilidade ante circunstâncias sobre as quais carecemos de controlo, como a inflação. Conceitos como a agrobiodiversidade, a soberania ou a segurança alimentar são fulcrais à hora de garantir uma alimentação de qualidade a preços acessíveis para toda a população. Os policultivos intensivos em trabalho colidem com a procura da máxima rentabilidade, atacando as estruturas de pequenos produtores independentes, os canais tradicionais de comercialização e a garantia do controlo público. A promoção de vantagens comparativas esconde o desmantelamento do cultivo tradicional e a apropriação do mercado mundial de sementes e produtos agrários por parte das multinacionais que cotizam nos mercados financeiros, elevando os preços alimentares. O impulso dos canais curtos de comercialização, do comércio de proximidade, e da agricultura ecológica joga a nosso favor por três razões: a sustentabilidade produtiva, a segurança, soberania e saúde alimentar e o aumento da competitividade baseada na qualidade do produto. Para isto é que compre defender os nossos sectores primários e consolidar uma indústria transformadora própria.