Opinión

A nova ordem mundial ainda terá de esperar

Nos últimos anos tem-se falado muito do advento de uma nova ordem mundial, sobretudo devido ao desenvolvimento da guerra na Ucrânia ou ao suposto reforço dos Brics com novos membros. A fraqueza ocidental parecia manifesta e uma nova ordem pluripolar parecia iminente, mas este ano que está a chegar ao seu fim, especialmente nos seus últimos meses, não parece ser muito prometedor para aqueles que a vêm não só como inevitável, mas também como algo positivo.

Em primeiro lugar, há o impasse na guerra na Ucrânia. Embora a contraofensiva ucraniana tenha falhado totalmente, não se pode deduzir daí que a Rússia tenha feito grandes progressos na sua invasão, uma vez que passou todos estes meses na defensiva e as suas contra-ofensivas também não parecem ter tido grande sucesso. Não é muito em dois anos para a grande potência que pretende ser. É verdade que existem divisões internas na Ucrânia, mas estas também estão presentes na Rússia, basta ver a necessidade de eliminar Prigozhin ou a repressão de Navaltny, que Putin teme como líder da oposição, ou a anulação de qualquer possível candidatura da oposição. Se acrescentarmos a isto o facto de os fundos russos congelados em bancos ocidentais (uma soma equivalente ao dobro das despesas de guerra da Ucrânia até à data) serem muito provavelmente devolvidos aos países invadidos para a compra de armas, é provável que a guerra se arraste. Seria um belo paradoxo se o dinheiro da Rússia fosse gasto na compra de armas contra a Rússia. Se acrescentarmos a isto o facto de os preços do petróleo e do gás estarem a cair na origem devido ao enorme aumento da eficiência dos produtores norte-americanos e à queda da procura global, principalmente devido ao abrandamento económico da China, o futuro da guerra não é o que Putin previa há alguns meses.

O conturbado Médio Oriente é outra área em que o discurso multipolar está a ter problemas. Esperava-se uma reação maciça do mundo árabe contra a invasão de Gaza e não só o mundo árabe não está a fazer quase nada (à exceção dos Houthis no Iémen), e parece deduzir-se que não só estão a tolerar o ataque como também estão a encorajar Israel por trás a acabar com o Hamas, que parecem considerar um incómodo nas suas agora boas relações com o Estado sionista. Mesmo o Irão não parece ter-se mobilizado muito com as suas milícias por proxy no Líbano e na Síria em defesa dos seus parceiros. Este fracasso da mobilização árabe também é suscetível de afetar a Rússia a médio prazo, uma vez que esta se apressou a apoiar a causa palestiniana. No final, ainda será a NATO que acabará por exercer pressão sobre Israel para conseguir um cessar-fogo.

Na América Latina, outro dos pilares do mundo multipolar, a Venezuela, que há algumas semanas parecia confiante na recuperação do Essequibo, chegando mesmo a nomear administradores para o território, e que lançou uma nova ronda de repressão contra a oposição, parece ter mudado de ideias. O seu ardor bélico cessou subitamente quando encontrou as tropas do Grande Satã capitalista, lideradas pela General Richardson, alinhadas na Guiana, e começou subitamente a falar de paz e de diálogo. Esta posição foi apoiada por uma troca de prisioneiros e pelo cancelamento da planeada viagem de Maduro à Rússia. Talvez o presidente venezuelano também pareça estar consciente da deriva do mundo e não pareça ter muita confiança na liderança da Rússia na nova ordem que se avizinha. Vamos ver o que nos traz o novo ano, e aproveito para felicitar toda a gente o novo ano 2024.

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