Opinión

Fabricar eletricidade. Para quando a reparação dos danos ambientais e do sofrimento?

Galiza produz 33% mais eletricidade da que consome. A custo das nossas terras de lavor, nossas vilas, nossos rios e rias, nossa história, nosso sofrimento humano num exílio interior e num desgarro emocional que poucas pessoas podem imaginar se nunca se viram na situação de abandonar suas casas, seus campos, seu meio de vida, seus horizontes para deixar que as águas os alaguem e sepultem a seus olhos.

Recentemente estive visitando a vila alagada de Aceredo. Por uns dias à vista por esvaziado da barragem de Lindoso. Senti a dor dos muros de pedra. Os perpianhos ainda sustinham paredes direitas e uma formosa fonte deitava água limpa da que bebi. Um antigo habitante contou-nos da vida do povo. Os banhos na beira do rio, as árvores que assombravam suas margens, os bailes na sala de festas, a vida que já não é. Onde a autossuficiência era a norma. Tenho uma amiga que teve que abandonar as terras de Portomarim aos seus 5 anos. Ainda tem saudades e dor da ausência. Quem vai compensar o sofrimento? Na aldeia do Seixom a vizinhança teve de saírem monte través, levando suas pertenças porque a estrada ficara alagada. Deram-lhes a eles mais barata a luz? Deram-se facilidades para instalações industriais nas terras próximas ao encoro? Nunca. Quanta emigração provocaram esses sacrifícios para beneficiar empresas imbricadas nos centros de poder (Fenosa, ligada a Franco; Iberdrola, a cujo presidente Núñez Feijóo abraçou entusiasticamente na praça do Obradoiro no dia da sua tomada de pose como presidente da Galiza, etc). Uma civilização que focaliza tudo para as urbes e despreza o poder do território como sustento físico e produtor de alimento e de cultura está levando à Terra ao desastre ambiental como nunca antes na historia desta Matria, lar comum que é o nosso planeta. Porque as cidades são devoradoras de recursos vindos de qualquer parte do mundo, nomeadamente do sacrifício do rural, e primeiras responsáveis polo aquecimento global.

Engolem sobre tudo energia que tem de ser levada até lá por linhas que cruzam Galiza em todas as direções, somando seu impacto ambiental ao que provocam encoros e campos eólicos. Madrid é paradigma deste desproposito. Todo tem de lhe ser fornecido desde os territórios de sacrifício como Galiza que pagam o gasto por transporte mais a perda dos seus valores ambientais e históricos com a destruição de seu ambiente. A consequência é o abandono dos campos produtores de alimentos e o êxodo para as vilas e cidades. Agora, com a guerra de Ucrânia estamos a ver os riscos mortais que a dependência de recursos provoca no subministro de alimentos quer para humanos quer para animais. Uma questão absurda e de errado planeamento. Poderíamos nacionalizar nossa eletricidade ou servimo-nos a partir de comunidades energéticas em que as comunidades de montes poderiam funcionar como unidades de autogestão. Poderíamos tornar públicos aqueles encoros cuja concessão caducasse. Mas a Xunta não quer. Prefere dar-lhos as empresas. Ou bem deitar a barragem e libertar as águas. Por todo o mundo estão a ser derrubadas. Na nova cultura da água recomenda-se isto. No quadro ambiental do câmbio climático também é recomendado. Os encoros são fontes de produção de metano, 34 vezes mais ativo no aquecimento global do que o CO2. Neles acumula-se pesticidas, herbicidas e adubos procedentes da má agricultura que está a ser feita na atualidade. Nitratos e fosfatos provocam uma grande proliferação vegetal e bacteriana que acaba por reduzir o teor de oxigénio nas águas e provocar sua degradação com uma caraterística cor verde. A cauda verde da barragem de Castrelos do Minho é visível desde os satélites. Ainda não está avaliado a nível global o contributo dos embalses ao câmbio climático, mas podemos inferir sua magnitude. As águas livres são fundamentais para a saúde humana e garantir a biodiversidade dos rios e das rias. Assim quanto os aportes necessários de sedimentos que fertilizam as terras ribeirinhas e o mantimento do bosque de ribeira que garante um bom funcionamento do regime hidrológico. Temos que recuperar a nossa cultura de autossuficiência. Não existe outro caminho para a sobrevivência e a liberdade.

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