Opinión

Avións e pontes: outra vez os neologismos

Nessa tarde o assunto da aula som viagens. Na gravaçom, umha mulher emprega “aterrar” e “levantar voo” para falar do que fai o aviom em que viaja. O professor acrescenta ao léxico útil o verbo “descolar”. E a seguir chega a pergunta fatal: “E como se di isso em galego?”

A aluna notou que na televisom empregam umha palavra esquisita e quer saber se dá jeito nas aulas. Um pequeno esforço de memória conduz a “é algo como engalanar”, e no dicionário académico confirma-se que na T.V. dizem “engalar”.

É o primeiro passo numha nova descoberta acerca da ignorância coletiva sobre a nossa língua culta. O professor pensava que existiam dous tipos de falantes, os que utilizam despegar, e os que empregam descolar. Uns com o modelo popular (e castelhanizante), outros com o reintegracionista (e lusitanizante). “Engalar” é a hipótese que faltava, a pretensamente isolacionista.

Apesar de os voos comerciais terem um século de história, para o diretório linguístico (i.e. RAG) a aviaçom mereceu ser abordada como neologismo. Num artigo do Portal das Palabras (de 2019) explicavam os antecedentes: engalar é empregado na primeira referência escrita, num jornal agrarista da Fonsagrada, ao primeiro voo no país, o de José Pinheiro. Este exemplo paradigmático de praxe isolacionista cita também a inclusom em 1932 do termo num dicionário, sem referir qual. O Dicionario de dicionarios esclarece que era no Vocabulario del Bable de Occidente. Trata-se pois de um dialetalismo do nosso Oriente. E o interesse dos dicionários nom acabou. “Engalar” aparece como variante de “nalar” no Diccionario General de la Lengua Asturiana. Estamos, portanto, perante umha palavra-ponte sobre o Eu… e o Návia.

Como é costume nos seus arrazoados, o Portal reserva um espaço para o português. Apresenta como exclusivo dos falares lusitanos o significado de “engalar” recolhido, como verbo pronominal, no Diccionario de Eládio Rodríguez (1960), e omite o registrado por Aníbal Otero. A tradiçom lexicográfica é desterrada... para Portugal, e a proposta aeronáutica é a única legítima.

Depois deste exemplo ninguém deverá surpreender-se se, qualquer noite, umha jornalista declarar proscrito o aviom porque o diretório resolveu aproveitar a criaçom de Otero Predrayo, e instituir “castromil-do-ar” como único termo válido.

As acrobacias académicas na delimitaçom do que é galego ou nom, e no que deve ser o galego culto, som habituais desde que o (nosso pequeno) mundo é mundo. Porém, resultam mais chocantes quando acompanham discursos e eventos oriundos da mesma instituiçom proclamando a internacionalidade do galego. Mais agora que se debatem possibilidades de convivência entre as correntes tradicionalmente divergentes.

Engana-se quem pensa que a reclamaçom que ilustrava a capa deste jornal a 2 de março, o Open the border na Ponte da Amizade entre Goiám e Cerveira, é apenas conjuntural ou transitória.

Comentarios