A okupar as músicas

Na comuna as regras são outras. Não melhores, não piores. O suficientemente outras como para as sentir liberdade, frescura, alento. A comuna del Barruzo / Ugia Pedreira, Pierrot Rougier, Mónica Justo / A Central Folque / 2018 Nesta comuna del barruzo arrejuntaram-se vozes, músicas, desenhos e, ao partilharem forças e fantasias pariram um livro outro. Um livro-disco livre, fresco, que alenta em cada pista. Pouco podemos opinar de melodias e arranjos aquelas que pouca música sabemos, mas podemos dizer de letras e vozes. Aquilo que adoramos da Comuna é de trabalhar para as crianças deixando de banda que está a trabalhar para crianças. A liberdade, a frescura, o alento despregam-se como asas e abraçam-nos com textos inteligentes, que não evitam construções ou léxico complexos. O primeiro, a aperta de uma língua diversa, com os seus matizes naviegos, desconhecida para quase todas nós. Adoramos escutar telergas, abolas, nenas pisquelas, cocías e noitías. Adoramos que se nos apareçam o Colobrom, o Home Martim, o Patarico, acarão da motocicleta, o as tripas revoltas ou a malícia. A comuna conhece como ninguém as estruturas dos cantos tradicionais e tira deles quando quer. E quando quer, não. Constrói um arrolo com caixinha de música, edifica um jogo de contar (umdoustrês, trêsdousum), resposta e pergunta, pergunta e resposta, estrofeia com rima nos pares, como sempre foi, estrofeia sem rima e sem pares, porque sim. A liberdade das comunas faz isso, que uma apanhe ou deixe segundo goste ou precise. As comunas falam daquilo que desejam, de um mundo sem plásticos, daquilo que odeiam, das baleias e os seus bandulhos enchidos de lixo, mas sobre todo, daquilo que gozam: de debulhar o milho, de beilar com o vento da ligeireza, do hipotálamo e o seu lugar na cabeça. E pouco podemos opinar de melodias e arranjos aquelas que pouca música sabemos, mas podemos dizer que adoramos as combinações estranhas de instrumentos, brincando a ritmar entre eles, das guitarras a eletrizar o ambiente das pandeiretas, dos sons de fundo que acompanham a dança, da diversidade de estilos melódicos. As comunas emergem lá onde outras deixaram a casa baldeira, lá onde outrem renunciou à alegria de perguntar. As comunas okupam a música. A poesia.