Obscena subserviência

Referimo-nos aqui à intensa subordinaçom formal do galego oficialista ao castelhano, escandalosa em olhar atento. Ela chega ao extremo de o modelo RAG=ILG transferir para o galego casos únicos, peculiaridades simbólicas, excentricidades e até maneirismos da língua castelhana (de Espanha), em detrimento de dimensons vitais para o nosso idioma, como a seguir imos ver com recurso a umha pequena amostra de casos. O leitor deve saber que a letra Ñ tem origem natural no cast., porque o seu til (rabisco ondulado e encimado) surgiu a partir da marcaçom do segundo n de um ene duplo etimológico que, em cast., véu a realizar-se com o correspondente fonema palatal (ex.: lat. canna &gt; cast. canna &gt; cast. canna &gt; cast. caña), de modo que o Ñ nom se pode ter originado em galego, umha vez que o nn latino, em galego-português, simplifica em n e nom dá lugar àquele fonema palatal (lat. canna &gt; gal-port. cana). Mas a RAG=ILG impinge o Ñ ao galego, assim nos furtando umha vivificadora osmose galego-portuguesa e nos mantendo sob o império simbólico do cast., que tem justamente o Ñ como marca identitária ecuménica. (Para cúmulo, agora o Concelho de Tominho estiliza e magnifica no seu nome o Ñ cast., num gesto que pode entender-se como síndrome de Estocolmo ou como sublimaçom do abusador por parte de umha mulher maltratada e alienada). Atençom!, se no galego oficialista palavras como guerra e guitarra se escrevem com gu, tal só acontece por subordinaçom ao cast. (cf. al. Gitarre, êusc. Agirre): em cast. (e em gal-port.) aí o u é necessário, porque, nas seqüências ge e gi, o g representa um fonema diferente (guerra/gente), mas o galego RAG=ILG (de forma aberrante) nom conhece as seqüências ge e gi (e si xe e xi: guerra/xente), de modo que, por coerência, a grafia oficialista deveria ser gerra e gitarra. O galego oficialista, com poucas exceçons, decalca a prosódia dos eruditismos cast., e mesmo em casos em que ela é antietimológica (ex.: *cerebro, por cérebro) ou incoerente, como acontece com o par enerxía + *alerxia: o segundo radical destes dous termos coincide, -ergia, derivado do gr. érgon 'trabalho', polo que os dous termos devem ter a mesma acentuaçom, a etimológica grave; portanto, no galego oficialista, como enerxía, deveria ser alerxía. Só o cast., entre as línguas románicas, mostra hoje de forma produtiva a habilitaçom de particípios como substantivos indicativos de açons: el lavado (del coche); el enlatado (de la sardina); el revelado (de la película). Por isso, o galego nom o deve fazer, de harmonia com o cat., fr., it. e, sobretodo, com as suas covariedades lusitano e brasileiro (a lavagem, o enlatamento, a revelaçom). No entanto, infelizmente, o DRAG mostra hoje inúmeros casos dessas espúrias habilitaçons. Desde o oficialismo reforçam a dissoluçom do galego no castelhano, tornando hoje o nosso idioma socialmente redundante No DRAG, o oficialismo renuncia à plena regeneraçom léxico-semántica do galego em benefício de umha hibridaçom: vimos nas peças anteriores a deturpaçom oficialista de tirar 'extrair, obter', e um caso similar é, p. ex., o do tradicional corrida 'açom de correr', ao qual o DRAG incorpora o concorrente cast. *carreira, que, assim, já extingue corrida nos usos públicos. É tam intensa a subordinaçom do galego oficialista ao cast., que o DRAG está cheio de neologismos decalcados do cast. que atentam contra a morfologia do gal. (ex.: *bocadillo [gal-port. sand(uích)e], *cepillo [gal-port. escova]), contra a sua constituiçom lexemática (ex.: *chuleta 'papelinho para copiar num exame' [gal-port. cábula]), contra a sua eufonia (ex.: *a silicona [gal-port. o silicone], equivalente em cast. a el silicoño!) e contra a sua funcionalidade (rata 'rato-fêmea + ratazana'; cobra 'cobra + cobra-capelo', equivalente a chamar em cast. culebras às serpentes que este denomina cobras!). É tam intensa essa subordinaçom, enfim, que o DRAG adota esquemas de excentricidade neológica castelhana, como usar, junto com fútbol e wáter-polo, baloncesto e balonmán (gal-port. futebol, basquetebol, (h)andebol, polo-aquático), e, junto com baloncesto, canastra, e nom cesto (!). Chegados a este ponto, concluímos que, como fruto desta intensíssima subordinaçom formal, o oficialismo reforça a dissoluçom do galego no castelhano, tornando hoje o nosso idioma socialmente redundante. Portanto, queiram os amáveis leitores desta peça remeter cartas cortesmente redigidas ao Supremo Codificador Oficialista, a reclamarem o abrandamento desta obscena subserviência, com o objetivo de darmos oportunidade ao galego de se emancipar do castelhano e de constituir, em coordenaçom com as suas covariedades lusitano e brasileiro, umha língua de cultura capacitada para viver: Ilmo. Sr. Manuel González González, ILG / RAG / Fac. Filologia USC / Centro Ramón Piñeiro / Termigal...