Uma fração daquilo que somos

Diseram-me o outro dia as moças do Clube Feminista da escola: temos que falar de orientação sexual, temos um sarilho enorme na cabeça. Que há entre queer e pansexual, onde a bisexualidade, que significa ser cis? E eu ainda não lera o Nom estamos quebrades, de Nee Barros, porque se assim for não faria mais que mostrar o livro e dizer: tendes que ler isto. Não. O romance, breve, não é um guia ou um mapa de possibilidades no espetro das identidades sexuais. Que bem podia ser aquilo que aguardávamos dele, por conhecer e autore. Não. Quem queira guias ou mapas que procure nas redes. Nom estamos quebrades é a narração de um caminho, de uma maneira de andar, de um procurar quem, onde, como sou eu. Quadra aí com muitas narrativas adolescentes. A protagonista, Eva, estuda em Santiago e após se deixar com o moço, faz por pesquisar-se, por aprender-se, por construir-se como pessoa e adulta. Já dissemos: nisto, como tantas narrativas anteriores. Do que gostamos na aventura de Eva é que faz o caminho acompanhada. E por que não apanhas este desvio? Eu vou contigo. E por que não provas esta penedia. Eu dou-che a mão. E por que não atravessas o espelho? Eu cruzo contigo. Foge e autore da protagonista sozinha, abandonada, torturada na sua individualidade e isolamento. Pola contra, constrói um mundo de redes onde as iguais, as diversas iguais, vão saindo ao caminho para animar, para oferecer sombra e água, para massagear pernas, para dar abrigo. Eva estuda em Santiago, duvida da sua sexualidade e convive com o seu autismo. Ao seu carão, Edu é o cicerone que a pretende levar de viagem ao paraíso do gozo e a diversão. Só assim hás-te encontrar. A procura de uma mesma não é, desta maneira, uma carreira de obstáculos, mas um hedonista passeio pola festa. Ou não. Também o Edu tem cousas que aprender. Ele e as suas amizades vão mostrando a Eva um mundo para ela novo: o das sexualidades dissidentes. Uma olhada às relações amadoras e amantes desprejuízada e libertada de didatismo. Porém, para mim, o melhor, não é, como sempre, o final, mas o andar. Aprendermos que as pessoas não somos em essência, mas em construção. Que não há nada em nós que não poda mudar ou ser distinto, que cadaquém decidimos que queremos ser, como queremos ser ditas, como queremos ser tratadas. Adoro a olhada otimista sobre as possibilidades de uma moça autista e estudante encontrar a alegria entre amizades. E que exista festa em galego, mesmo fora dos livros.