Missão cumprida, Marica

Uma das regras básicas que deve respeitar uma autora de literatura infantil é a de não ter as crianças por parvas, por adultas defeituosas. E isso é algo que Marica Campo nunca faz. Meninha espilida que ela foi, não nega às novas leitoras a curiosidade nem a capacidade de aprendizagem. Só com essa clara consciência podem ser batidas na mesma cunca referências a Rosalía de Castro, aos Beatles, ao Quixote, a Ibsen e Edvard Grieg, a Noah Sealth ou ao arrastraches o cu polas palhas da tradição oral. Todo numa obra dirigida a leitoras de dez anos. Que não são parvas. Unha misión para Clara / Marica Campo / Oqueleo / 2018 / 128 páxinas / 10,35 euros Marica Campo segue a consigna que põe em boca de uma das personagens da obra: investiga ti, eu nada máis che vou contar o conto. Clara é uma meninha sabichona com vida de meninha sabichona: ir à escola, fazer os deveres, participar nas extra-escolares, colaborar na vida doméstica, saber de cor a letra de Lucy in the Sky with Diamonds. Até que um dia abre a porta sem perguntar antes quem chama, para dar de focinhos com Nimo, um meninho esbrancuxado que de início, não fala. Nimo não é outra cousa que um elfo chegado das suécias para lhe encarregar um missão a Clara. O compromisso da sua vida: salvar a biodiversidade das fragas galegas, representadas pola de Pedrasirtas, a aldeia da família. Um lume florestal pôs em perigo o arvoredo e Clara deve pelejar porque isso não volte acontecer. Três cousas destacaria na obra. Por unha parte, a riqueza linguística do texto, que rejeita explicitamente simplificar a língua, reduzi-la a koiné castelhanizada para fazê-la compreensível. Sendo a autora ciente da cada vez menor diversidade léxica e expressiva das galego-falantes, recorre à sinonímia, à enumeração, à perífrase, à redefinição, quando considera que deve aclarar um conceito, mas nunca renuncia a utilizá-lo. Por outra banda, as já referidas referências culturais. A autora introduz na narrativa livros, músicas, lendas, cinema, elementos de botânica, que chegam mesmo a fazer parte significativa da trama, como a Lucy dos Beatles. As personagens dialogam sobre elas, na procura da curiosidade nas leitoras. Porém, do que mais gostamos na obra é de ser toda ela um canto à imaginação, ao despregar asas e voar por céus de malvavisco entre nuvens de plasticina. À vida de Clara chega um elfo e ela aceita-o, as árvores falam-lhe, e ela goza-o, o trasno faz-lhe trasnadas, e parece-lhe normal. Dizem as árvores: as raízes ligam uns mundos com outros. E quem sonha, pode-o mudar todo.