De facetas e diamantes

A té que ponto é a biografia um género infantil? Até que ponto as crianças, que pensam que as suas mestras convivemos com Maria Solinha ou Rosalia de Castro (Conheceste-a?, Estavas ti ali?, são as frases mais ofensivamente idadistas que podemos escuitar na sala de aulas), têm interesse real numa história de vida? Muitas vezes duvido. Por isso agradeço obras como esta Alma de Violino. É biografia. Faz o caminho do nascimento à morte. Porém há algo mais que biografia. Não é a cronológica a linha de união escolhida. E isso é bom, acho, porque como digo, é nos tempos onde se nos perde a rapaziada. A linha de união são as palavras. Aquelas que conformam a alma de uma pessoa. Aquelas que nos definem e com as que nos construímos. Alma, a narradora, é parte da vida de Luísa Villalta. Habita o seu violino, com o que a poeta virava o ruído em música. E Alma escolhe as palavras mais importantes da vida da Villalta para nós: infância, violino, língua, Galiza, silêncio, compromisso, escrita, cidade, mulher, alma. Alguns dos vocábulos selecionados (Galiza, compromisso, mulher) correm o perigo de se esvair na brêtema das homenagens oficiais, polo que agradecemos que emerjam com maiúscula de título. Enormes. Cada verba, um capítulo da sua vida, ou melhor, uma faceta. Todas elas, em conjunto, achegam-nos a figura do diamante, da artista. As autoras, Beatriz Maceda e Eli Ríos, introduzem citações da poeta como interlocuções com Alma, a narradora. Oferecem assim pingas contextualizadas da sua obra, abundo complexa, e fazem-na mais acessível. Elemento essencial no álbum são as ilustrações, em diálogo diáfano com o texto, ricas e abondosas em pormenores para observarmos e fazermos leitura de imagens. Há detalhes que Laura Suárez reitera em várias das páginas, para que as observadoras atentas repararem. Uma estrelinha (no bico um cantar) recorre as páginas, passeando a Alma de um momento a outro da vida da protagonista. Também nos desenhos se aparece a voz da poeta, integrando a ilustração com naturalidade (adoramos a reprodução completa do poema a Bóveda). Luísa Villalta é uma poeta difícil. Algumas levamos messes dando voltas a como trabalhá-la na escola, como fazer para a achegar ao alunado, em especial ao de menor idade. Por esta razão valoramos enormemente que outras companheiras deem com a maneira de explicá-la sem a reduzir, sem a simplificar, sem a censurar. Sem fazer do diamante, negro carvão.