Carta em tinta de choco

E chega Eva Mejuto e com a sua Teresa, que aguarda polo pai a 20.000 léguas de distância, oferece ao Nemo um lugar na homenagem que é o seu álbum às lavandeiras de São Simão. Essa é uma das alfaias que traz consigo, emburulhada em papel de cartas, esta obra. A lavandeira de San Simón / Eva Mejuto / Ilustrações de Bea Gregores / Xerais / 2020 / 40 páginas / 15,50 euros Há mais. As guardas trazem para nós a História, tecida em fotografias e em um texto final explicativo. São abundas para sabermos quanta verdade expõe a literatura e para contarmos com fios de que atirar se queremos saber mais. Porém, passadas as guardas, a capa, os dados técnicos e os títulos só está a meninha Teresa a contar a sua Estória, que bem pôde ter escrito com tinta de choco na sua concha e enviada ao papai em barquinho-carta. A lavandeira de San Simón coloca no centro aquelas figuras que nos trabalhos sobre memória história ficaram esfumadas e mesmo apagadas: crianças e mulheres. Teresa ajuda nos trabalhos à sua mãe, Ramona a Monera, e todas as quartas a acompanha até Cesantes, onde embarca para levar roupa limpa e a comida que pode a algum preso no campo de concentração. Teresa não percebe muitas cousas, entre elas por que é que a mãe faz isso, mas também percebe muito mais do que todas pensam. E quer ajudar. E quer ver. E quer acompanhar. A resposta é sempre a mesma: não. Até o dia que a resposta muda: sim. Nesse dia comparte viagem com Xulio e a sua mãe, Peregrina, que vão visitar a Rafael Lima, preso na ilha. E lá presenciam um momento de terror. A Lavandeira de San Simón é um álbum ilustrado. E a simbiose entre escritora e ilustradora é absoluta. Bea Gregores acompanha o conto de Eva Mejuto sem calcar-lhe os pés nem atropela-lo. Se no conto Teresa é quem nos guia, nas ilustrações são a cor vermelha e o passarinho encarnado. A cor enche as lâminas umas vezes, destaca roupas, panos e telhados por outras. E o passarinho acompanha às personagens polos espaços de liberdade vigiada, escondendo-se como em árvore galeana chegadas ao peirão da ilha. E ao final do livro, cresce e voa em metáfora de mensagem ultramarina. Para chegar a nós.