Opinión

O nosso clado e a nossa vontade

É necessário imaginar o futuro da nossa língua. A aceitaçom duma imagem coletiva é um motor poderoso para caminhar numa direçom… ou na oposta.

Entre nós está muito presente a imagem duma árvore abrindo-se em dous galhos, um o português e o outro o galego, como um Y. Representaria a separaçom da língua comum em duas, por evoluçom. É suposto ser irreversível: quando é que se vírom dous ramos duma árvore a unir-se de novo num tronco comum?

Nom gosto de considerar evoluçom a nossa separaçom forçada por um agente externo. Mas contudo, nem sequer a evoluçom se comporta como uma árvore, comporta-se antes como um rio.

O rio, que corre de baixo para cima, abriu-se em dous braços. A nossa corrente está a afastar-se da portuguesa e vai caminho de confluir com outra paralela, a castelhana, como um transvase. A imagem gráfica seria entom como И. Vestir ortográfica, morfológica e sintaticamente o galego de castelhano nom fai mais que acelerar a desembocadura nessa língua, para acabarmos por ser um sotaque dela.

Mas há alternativa! O braço dum rio (clado, na teoria evolutiva), em vez de desembocar noutro pode voltar a juntar-se. "Caso as barreiras que separam as duas populações se rompam (...) as diferenças adquiridas durante o isolamento vam-se diluindo.

Imaginemos entom o desenho dum P em vez dum И ou Y, as duas correntes do rio voltando a comunicar-se de novo, superado o isolamento.

Já tem acontecido por exemplo com a língua da Flandres e dos Países Baixos, que depois duma separação secular se reintegrárom num neerlandês comum. Pode perfeitamente acontecer com a língua comum da Galiza e Portugal, se dermos os passos na direçom correta.

É uma questão de decisom, é preciso vontade coletiva. Será que a temos? Parece que sim, dado que a Lei Paz Andrade foi unânime no Parlamento Galego. Mas na prática, quais os passos reais que estám a dar entidades públicas e privadas?

Algumas coisas parecem ir polo caminho certo: temos mais um pouco de português no ensino secundário galego e alguns encontros desportivos.

Outras colaborações interessantes, nom se sabe ainda ao que conduzirám no campo linguístico: dupla formaçom profissional transfronteiriça e universidades sem fronteiras na euro-regiom. Nestes casos, usaremos nós a língua comum galego-portuguesa ou acabaremos por pedir ao alunado português para falar em castelhano?

Faltam ainda tantas cousas que nos parece que a aplicaçom da lei vai muito, muito devagar. Comércio retalhista e etiquetagem, livros e revistas, o mundo laboral e da empresa, a justiça…

Há inúmeras cousas que uma pessoa galega ainda nom pode fazer na língua comum galego-portuguesa, na própria Galiza. Ademais precisaria reforço linguístico para fazê-las com jeito em Portugal.

E o tempo é um fator chave. Não é o mesmo dispor dum bem (umha estrada, um comboio, um conhecimento…) hoje que dentro de dez anos. O rio continuará a fluir, se não atuarmos rápido, em direçom ao castelhano.

Tantas gerações de imersom mediática ajudam a assumir esse destino como natural. Imaginem que em vez de terem estado expostas por décadas a Machín ou Rocio Jurado, filmes de Joselito ou de Paco Martínez Soria… tivessem sido expostas a produções luso-brasileiras dessas épocas: Pixinguinha, Orfeu Negro, Dom RobertoElis Regina, Dona Flor. Sem julgar qualidades nem ideologias, como seria agora a visom galega da língua e a sua vitalidade?

Água passada nom move moinhos, bem sei. Porém, sendo que a lei Paz Andrade nos encoraja a disponibilizar, urgentemente, canais audiovisuais portugueses e brasileiros na Galiza, recentemente ficou livre um canal de TV TDT e por enquanto se deixou deserto, em vez de atribui-lo a este fim. Realmente queremos?

Nom se vem ainda muitas pessoas públicas mostrando jeito e vontade para comunicar-se na língua comum com Portugal. Estám a mudar essas vontades? E nas novas candidaturas a cargos públicos? E no setor privado?

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