Opinión

Palavras (II)

Falava num anterior artigo da eleição da palavra “emoji” como palavra do ano 2019 no castelhano. Investiguei qual teria sido a palavra do ano em galego e uma vez mais evidenciou-se o nosso bom sentido. A palavra do ano 2019 na Galiza foi “sentidinho”. Fronte a uma palavra que não é palavra e que define o empobrecimento da comunicação, na Galiza elegeu-se outra palavra, como mais votada no Portal das Palabras, a web de divulgação do léxico galego de RAG em colaboração com a Fundação Barrié, que se refere ao sentido comum como antídoto eficaz para muitas das preocupações sociais, especialmente em época de mudanças, tribulações, imprevistos, incerteza, confusão, instabilidade... semelha não haver outra palavra mais adequada que o “sentidinho”, ignorando inventos sediciosos de comunicação inaplicáveis á necessidade imperiosa de comunicar-se e não com bonequinhos (como ocorre com os emojis), senão com a seriedade que exige a dificuldade de entendimento que se está a dar. Fiquei contente de como a escolha feita por nos era exata e oportuna na situação política e social que impregnara o ano que rematou. Não só pola palavra em abstrato senão que esta chega-se a constituir uma inspiração, uma reflexão, uma resolução para os indivíduos de como atuar perante os retos e provocações que desde a sociedade, desde a política e desde a economia se nos estão a fazer, muito especialmente desde as atitudes ditatoriais e imperialistas que impedem o exercício dos direitos humanos, entre eles o direito a decidir.

A palavra semelha ter perdido sua paz no tempo atual. Além dos que pretendem incorporar ao dicionário termos, modas e modismos transportados de outros idiomas, especialmente do inglês (por certo idioma tão alheio para nós que é de um país que a partir de finais de janeiro já nem é da União Europeia), mostrando nos linguistas castelhanos sua incapacidade para plasmar a palavra adequada etimologicamente castelhana que se corresponda com as novas realidades ou fatos, ou que polo menos se tome em empréstimo de idiomas de raiz latina e não da germânica que nos é totalmente alheia (ou minimamente histórica), incorporando palavras que não sabemos pronunciar, que não somos capazes de conhecer seu significado a não ser que se nos ensine, palavras que, muito suspeito, tenhem que sentir-se incomodas, ou tal vez incomodar ás que possuem carta de natureza, assentadas nos dicionários e de conhecimento e uso comum. Além de todo isso, de sentir que na casa das letras, no dicionário, incluem uns okupas sem nenhuma relação familiar nem de origem com as habitantes por direito próprio, outra luta se produze com a chamada “linguagem inclusivo”. Parece que ante o desleixo de não buscar a palavra, de origem castelhana e derivada do latim por parte dos Acadêmicos da RAE, se lhes apresentam novas tarefas para modificar palavras que levam séculos representando dignamente, e com consenso popular, seu significado. O Governo do Estado encomendou á RAE o estudo de modificação da Constituição; e dirá o leitor, “e que reforma pode fazer a RAE da CE, que artigos, que contido, que preceitos?”, bom, tranquilos, porque a reforma não será sobre o contido do texto constitucional senão sobre a forma de esse texto. Permite-me um inciso; não sei se me intranquilizaria mais que a reforma tão demandada da Constituição a realizarem políticos ou pessoas de fora da política; e também duvido que me tranquilize uma reforma gramatical ainda que seja realizada por linguistas. Continuo: o Governo encomenda á RAE a reforma no texto constitucional do gênero com que se redigiram no seu dia seus substantivo e adjetivos, adequando-o a uma linguagem que seja “inclusivo, correcto y verdadero, que se acomode a la realidad de uma democracia que transita entre hombres y mujeres” (Carmen Calvo dixit); a proposta inclui umas 500 palavras. Com muito sentido um dos Acadêmicos expressou que eles pensam que a linguagem inclusiva é a linguagem que falamos normalmente e outros expressarem igualmente que a RAE atua como notaria do uso da língua com juízos técnicos, não políticos, e maioritariamente sustentem que o masculino genérico não discrimina ás mulheres, que não se pode impor por decreto a linguagem inclusiva, que um dos princípios gerais do bom uso é precisamente à economia da linguagem e que resulta inquietante estender e ensinar um conjunto de variantes linguísticas que anulam distinções sintáticas e léxicas conhecidas. Parece que é critério maioritário dos acadêmicos que a RAE não pode ir contra sua própria doutrina nem extralimitarse da sua função de notaria da língua, mantendo sua ortodoxia linguística sem concessões ás demandas políticas, que neste caso venhem das esquerdas, mas muito temem que seu informe linguístico se leia com critérios políticos.

Já vemos que nem as palavras tranquilas, as palavras com pedigree, as palavras senlheiras, as de mais uso e também as de menos uso são zarandeadas para que despertem do seu machismo e deixem de uma vez por todas de chamar, por exemplo, “jornalista” a um rudo e respeitável varão em confusa suspeita de que pertença ao gênero feminino, como a própria palavra parece indicar. A modificação proposta pola RAE foi mínima, “rey” e “reina”, “príncipe” e “princesa” e pouco mais, pois como desde ali se afirma, a CE é gramaticalmente impecável.

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