Opinión

Lisboa

Outro dia ei opinar, mas hoje prefiro homenagear uma das cidades para mim preferidas (com Viena) que é Lisboa, na que passei férias de Fim de Ano, uma cidade que, muito modificada, ainda conserva seu encanto e beleza, que nada tem a ver com a Lisboa antiga e senhorial da canção e guarda distancia com aquela Lisboa que eu conheci no remate dos 60 inicio dos 70, entre recitais de Manuel Maria, que ajeitava o ilustre filho de Caritel e membro distinguido da jet Lisboeta, Pedro Cabo, com intelectuais e gentes acomodadas da cidade para trocar conhecimentos e resistência fronte a intransigência espanhola. Certamente os ambientes em que nos movíamos em Lisboa, de plenitude social, cultural e de uso do galego-português, nada tinham a ver com o panorama que deixávamos na Galiza; o Manuel muito graficamente dizia “este é outro mundo”. Anos nos que acostumei amar a Lisboa tendo como companheiros de viagem ao próprio Manuel Maria e Xavier Pousa. Foram mais tarde as coincidências com Pepe Posada e Xavier Alcalá e as conversas com Guerra Dacal que nos ilustravam sobre língua e cultura galego-portuguesa e relativas a vultos da literatura e política galegas. A todo o que significava para nos o relato e relação de privilegio com uma sociedade diferente, mas coincidente na fala e em vários casos com gentes em notória oposição ás ditaduras, acrescentávamos o encanto o magnetismo a graça a sedução e a simpatia da cidade, suas ruas e suas gentes, passeios por aquelas artérias, praças, miradouros, comércios e cafés, o trafego no cais, as casas de fado..., todo o que a ainda daquela capital do Império nos oferecia de novidade e contrariamente á longa noite de pedra cultural que deixávamos na Galiza.

Os ambientes em que nos movíamos em Lisboa, de plenitude social, cultural e de uso do galego-português, nada tinham a ver com o panorama que deixávamos na Galiza

Desde aqueles tempos muitas vezes regressei a Lisboa, viagens nos que fui verificando o evoluir da cidade, mais lento que o da própria sociedade portuguesa. Nesta nova viagem tratei de recorrer Lisboa com olhos novos, mas comprovei que era mais difícil esquecer que aceitar a nova realidade. Expectante cada dia descendia desde meu hotel pola Avenida da Liberdade, até a Praça de Restauradores e topei, com poucos meses de diferencia desde a anterior viagem, uma artéria requintada e cosmopolita, maioritariamente bordeada de hotéis de 4 ou 5 estrelas por uma beira e lojas das principais marcas de vestir do mundo globalizado pola outra, com algum restaurante no top da hostelaria; mas, feliz, comprovei que também conserva o bulevar central e, relíquias do passado, os quiosques de refeições simples. Restauradores e o Rossio seguem a ferver de gente, mas em ocasiões a fala portuguesa cede ante o inglês, o alemão ou o castelhano; às vezes parece menos Portugal. O Chiado é um fervedouro de nacionalidades diversas, mas conserva seu tipismo e o emblemático café da Brasileira, com a lembrança permanente a Pessoa ocupando uma das mesas do terraço e cadeira livre para um convidado, lojas de livros antigos, modernos e de ocasião. Do Chiado imprescindível seguir polo Bairro Alto aonde tens que ir polo dia para aspirar ainda algo da Lisboa clássica, preferentemente de manha, e mesmo veremos as mulheres conversar de janela a janela, rua por médio, como em tempos antigos; já pola tarde noite o ambiente é mais sofisticado e abruma a quantidade de locais de restauração e varias casas de fado; de novo multidão de turistas e falas do mais diverso; todavia lembro noites mais tranquilas de passeios demorados (era outra idade e podíamos subir as empinadas calejas sem esforço nem sufoco). Desde o Rossio miro para o Castelo de São Jorge e ainda vejo balcões e janelas na Mouraria com a roupa pendurada a secar. Todo o requintado e snob, modernista e global que pode semelhar a Avenida. da Liberdade fica esquecido com a visão de uma Lisboa popular, antiga, emblemática e original que atrai a vista e anima a caminhar para o bairro da Alfama que conserva o sabor do tempo passado nos seus restaurantes e suas casas de fados, onde afinal pude ouvir o fado vadio, o popular, e visitar sua original catedral. Os Jerônimos e Belém segue a ser a beleza, agora incómoda e opacada por multidão de turistas e visitantes. Segue a merecer a pena.

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