Opinión

O discurso de El-Rei

A longa tradição golpista do exército espanhol, as mais das vezes para assegurar a monarquia, algumas para derrocá-la e escassas a favor do povo, não deveria deixar cair na indiferença os claros avisos que estamos a receber em dias próximos do estamento militar. Por declarações recentes de algum exministro de Defensa chegamos a conhecer a existência em anos anteriores de comentários e atitudes de mandos militares reveladoras de uma clara afinidade com a ultradireita e o franquismo. Provavelmente avalentoados pola escassa repercussão social e a mínima ou inexistente sanção, foi aumentando a sensação de impunidade e na última semana do passado ano chegou aos médios e foi de total conhecimento um chat de mais de 40 altos mandos militares retirados, da XIX promoção do Exército do Aire, identificados, no que pediam a “purga de los rojos”, exaltam os assassinatos do ditador Franco: “Que Franco fusiló a mucha gente en la guerra? Mi respuesta es que a muy pocos…”, “Habia que aniquilar a 26 millones, niños incluidos”; mensagens de ódio contra o feminismo, o coletivo LGTBI, os independentistas, aos que desejam a morte, e chamadas ao combate. A resposta seguiu a ser lassa por considerar que era um grupo minoritário de retirados e propiciou uma carta ao Rei assinada por 39 dos que intervinham no chat, na que pretendiam que o Rei interviesse em política e derrocar o governo (estamos falando de dezembro passado não de um outro fevereiro); inda 73 mandos na reserva dirigem outra missiva ao Rei em 25.11.20 porque “el gobierno de coalición entre el PS y Podemos, apoyado por filoetarras e independentistas amenzan con la descomposición de la unidad nacional”. E há uma quarta carta assinada por 271 militares retirados na que se oferecem “a revertir la peligrosa deriva de nuestra Patria”. Lembram-lhe a Felipe VI que lhe deve o trono a Franco.

Todo isto destapou também a existência de vídeos, entre outros de abril de 2018 (de uma unidade de 250 pessoas entre cadetes e alfereces) e dezembro de 2020, com soldados do Exercito espanhol marchando ou celebrando com o saúdo fascista e cantando o hino de Divisão Azul. Feito que não parece de nostálgicos nem de aposentados aborrecidos. No seio de exército existe um grupo importante de ideologia franquista.

Soldados do Exercito espanhol marchando ou celebrando com o saúdo fascista e cantando o hino da Divisão Azul

O Rei ignorou os chats dos altos mandos militares difundidos polos media, TV incluída, que, certamente, não lhe iam dirigidos ainda que procediam de militares retirados dos que não deixava de ser Chefe supremo. Mas tampouco deu resposta ás cartas que se entregaram na Zarzuela e das que ele era o único destinatário; ao parecer, e não sabemos com que diligencia nem com que intenção, trasladou seu contido ao Governo. E nesse deixar passar chegamos á Pascoa Militar, cerimonia na que o protagonista é o exercito e seu chefe e que entendemos exigia uma resposta pública no núcleo do descontento. Mas o monarca liquidou os atos com um discurso plano e decepcionante ao que já nos tem afeitos, inda que quando lhe convém pode ser tão contundente como no discurso do 03.10.17; umas vagas referencias ao compromisso de todos com a Constituição e a obriga de respeita-la e observá-la (naturalmente estava defendendo seus privilégios e chefatura do Estado quando refere a defensa da legitimidade de todos os poderes e todas as instituições); teve que ser a Ministra de Defensa, que demostrou ter o que lhe faltava ao rei, para muito garridamente levantar sua voz denunciando com dureza os delírios, a intolerância e o alongamento castrense de uma insignificante minoria que só busca publicidade e prejudicam as Forças Armadas. 

Um silencio que pode resultar suspeitoso pois o que cala outorga e penso que são muitos os militares dignos e leais que encoitariam satisfeitos uma resposta clara por parte do rei. Prova é que esses mesmos militares díscolos dirigiram sua seguinte missiva crítica á Ministra, porque lhes doeu. Silêncio perigoso e também perigoso que por parte do governo não se tomem as medidas drásticas adequadas para eliminar das FFAA a semente do nazismo e do franquismo; este problema também presente em Alemanha foi resolvido pola Ministra de Defensa dissolvendo uma das Companhias das Forças Especiais do Exército pola sua deriva ideológica nazi e sometendo o resto a uma profunda reforma, ratificando o general-chefe seu compromisso a seguir uma linha de tolerância cero contra as forças de ultradireita.

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