Opinión

A morada escura dos não aceitados

Quiçá haja que tomar nota e pôr-se à cola, coa posição exata, no lugar adequado, para que che deem palmadinhas no ombreiro  e assim conseguir  aparecer  de soslaio, ser visível... 

Quiçá haja que tomar nota e pôr-se à cola, coa posição exata, no lugar adequado, para que che deem palmadinhas no ombreiro  e assim conseguir  aparecer  de soslaio, ser visível... 

"Não obstante, bem sei, tenho a certeza da desigualdade atroz que me bate nas costas e me eiva". 

Mas apesar de viver a contraluz, fora de ambientes escolhidos, ser mulher, pobre, classe trabalhadora e carecer de contactos interessantes, acordo cada manhã com a ilusão de uma incauta refletida na face. Não obstante, bem sei, tenho a certeza da desigualdade atroz que me bate nas costas e me eiva. Contudo, em ocasiões deixo-me afetar por um estado de onirismo conveniente.

Nasci com a perspetiva difusa, em preto e branco; irredenta, afogada pelo jugo do velho ditador. Medrei num esperpéntico cenário e acoplei-me à vida com a cegueira própria duma mulher treinada para o sacrifício.

Ainda que, às vezes confabulava estratégias para sair do cárcere da estereotipia e nesses momentos sentia a brisa acariciadora duma esperança mole que me beijava no ouvido, mas a sensação era tão efémera que apenas deixava um insignificante resquício na minha pele e alertavam injustiças, bombardeando às surpreendidas ruas com palavras idóneas, preparadas expressamente para a tirania.

"Medrei num esperpéntico cenário e acoplei-me à vida com a cegueira própria duma mulher treinada para o sacrifício".

Quando volvo a vista  atrás e reflexiono, compreendo que a situação não mudou muito. O tempo não é garantia de evolução. As coisas modificam-se só quando existe verdadeira consciência de mudança. O nosso amanhecer continua a ter esse tom cinza herdado de ontem, camuflado por detrás dumas siglas.

Algumas, presumem de igualitárias, justas, mas, estranhamente a cultura e nomeada e escolhida a dedo. Autodenominam-se donos do Olimpo!. Fora dos seus valados não existe nada, tudo vazio. Eles dominam a cultura!. Não há espaço livre nos seus domínios,  nas cidades. E  eu fujo das siglas, como se se tratasse dum mal de olho. Um carro de alta gama interceta-me por detrás, derruba-me sobre a calçada fendida. A morada escura dos não aceitados. 

A força do poder crunha-se com a dureza do ferro.

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