Opinión

Ei, carvalheira!

O bosque sagrado foi umha constante cultural presente em todo o mundo. Encontra-se tanto na Escandinávia como em Nigéria, desde o Lucus Augusti e a Nemetobriga de Trives até os inalcançáveis confins da selva Hercínia, além do Reno; desde a Ariccia romana e os proféticos carvalhos de Dodona até a Índia, a Nagóia japonesa ou o monte Hikurangi de Nova Zelândia.

O bosque sagrado foi umha constante cultural presente em todo o mundo. Encontra-se tanto na Escandinávia como em Nigéria, desde o Lucus Augusti e a Nemetobriga de Trives até os inalcançáveis confins da selva Hercínia, além do Reno; desde a Ariccia romana e os proféticos carvalhos de Dodona até a Índia, a Nagóia japonesa ou o monte Hikurangi de Nova Zelândia.

As florestas eram morada dos deuses e ali tinham lugar os ritos e cerimônias. Forom os primeiros templos da Humanidade. Os troncos das árvores erguiam-se como colunas e as suas copas entreteciam arcos e abóbadas que tamisavam a luz. 

"Com o transcurso do tempo,a Igreja descobriria que a sua aversom polas árvores, as que só suportava convertidas em cruzes, era menos lucrativa que assimilar aquelas manifestaçons pagás e impregná-las do  seu espírito. Assí nascerom as festas das cruzes de maio e as novenas marianas do mes das flores".

Para evangelizar as tribos germanas e demonstrar que os seus ídolos nom eram mais que uns lenhos, Sam Bonifácio talou o carvalho de Thor. Nenumha centelha o fulminou; mais a sua ousadia iconoclasta só serviu para corroborar a infinita clemência de Thor.  A conversom produziria-se o dia em que lhes deu a provar o sangue de Cristo. Após aquela libaçom, admitirom a superioridade do deus alheio e decidirom invadir a península ibérica à busca dumha transfusom redentora e permanente.

Decidido a eliminar de raiz a nostálgica imagem do carvalho da memória dos conversos, Sam Bonifacio inventaria a árvore de Natal. Escolheu o abeto por perene e adornou-no com maçancinhas coloradas, símbolo da tentaçom, e círios que representavam a luz da fé. Com o tempo substituiriam-se por bolas e lâmpadas de cores e os chineses descobririam que nom havia melhor perenidade que a do plástico.

A Igreja perseguiria toda festividade na que suspeitasse o menor vestígio indiciário de possível rito fitolátrico. O Concilio de Braga de 570 e Sam Martinho Dumiense, no seu De correctione rusticorum, condearom a festa dos Maios e, ainda no século XVIII, o cabildo compostelám proibia a entrada na catedral às maias, nenas ataviadas com flores, “por la indecencia de sus danzas y truhanadas”.  Apesar disso, os Maios persistiriam em toda Europa como rito ligado à renovaçom da vida e à fecundidade, e tamém sob a forma do ramo do alboroque na conclusom das obras. 

Com o transcurso do tempo, a Igreja descobriria que a sua aversom polas árvores, as que só suportava convertidas em cruzes, era menos lucrativa que assimilar aquelas manifestaçons pagás e impregná-las do  seu espírito. Assí nascerom as festas das cruzes de maio e as novenas marianas do mes das flores.

A Revoluçom Francesa, seguindo o exemplo dos independentistas americanos, instituiria o costume de plantar um carvalho nas festas cívicas, ao que se denominava “a arvore da liberdade”. Com a Restauraçom,  essas árvores seriam arrancadas e substituídas por cruzes. Após a revoluçom de 1830 replantariam-se e, com a repressom antirrepublicana de 1851, voltariam a ser taladas.  Com a proclamaçom da República em 1870, a arvore da liberdade constituiria-se definitivamente em símbolo nacional  que ainda hoje figura no reverso das moedas francesas de um e dous euros.

 "Aquel feito provocaria que, a instâncias da Conferencia Episcopal, o governo reformasse a lei hipotecaria, ao ano seguinte, para que a Igreja pudesse seguir registrando, como próprio, qualquer bem que carecesse de dono legal com a mera certificaçom dum arcebispo e o abono de 30 euros".

Em Alemanha, o carvalho erigiu-se em símbolo nacional por ser a principal espécie florestal espontânea e as suas folhas apareciam gravadas no marco. Com a criaçom do euro, o carvalho sofreu umha dramática devaluaçom, pois só figura nas moedas alemás de um, dous e cinco cêntimos. 

A carvalheda de Ettersberg, em Weimar, era um dos ícones da cultura germana, porque nela encontraram a inspiraçom  Bach, Goethe, Schiller, Herder,  Wieland, Listz e tantos outros, e porque conservava o carvalho que acovilhou o amor impossível de Goethe e Charlotte von Stein. Isso nom impediu que fosse talada para construir um campo de concentraçom. Muitos dos que na pós-guerra negariam conhecer a natureza desse centro, opuxerom-se a que levasse o sacro nome de Ettersberg e Himmler, atencioso e  romântico, decidiu chamá-lo Buchenwald, que significa “o bosque das faias”. Por ali passariam Leon Blum, Daladier, Bettelheim, Semprún e o eterno rebelde Stéphane Hessel.  No letreiro da entrada, que ainda existe, reza: “A cada qual, o seu merecido”.

Nisso devia pensar Franco quando aprovou a Lei Hipotecaria de 1946 na que recompensou os serviços prestados pola hierarquia eclesial, entre cujos príncipes destacava o cardeal Gomá, defensor da raça “como algo espiritual” e da denominaçom de Cruzada para a sublevaçom fascista que abençoou: “Benditos sean los cañones si en las brechas que abran florece el Evangelio”.

A quem a Providência lha der, Sam Pedro lha bença, que quem cedo dá, dá duas vezes – exclamou o arcebispo de Santiago, e inscreveu a carvalheira de Sam Justo e o monte de Lixó a nome da Igreja. Esqueceu que essas terras foram um dia Sherwood para as tropas napoleônicas e que os seus carvalhos nasceram quando os que os precederom eram artilharia vitoriosa em Ponte Sam Paio.  Nunca pensou que aquel bosque se poria a andar, como o de Birnam, com espantalhos de sotaina pendurados das suas pólas como adornos de Natal e que nom pararia até que os seus direitos forom reconhecidos polo Tribunal Supremo em 1997.

 Aquel feito provocaria que, a instâncias da Conferencia Episcopal, o governo reformasse a lei hipotecaria, ao ano seguinte, para que a Igreja pudesse seguir registrando, como próprio, qualquer bem que carecesse de dono legal com a mera certificaçom dum arcebispo e o abono de 30 euros.

 Os romanos sacrificavam um porquinho à divindade do bosque antes de proceder à sua limpeza.  Os que permitirom e ocultarom o espólio da carvalheira, dim que lembrar o acontecido é politizar as cousas. Podem seguir cevando-se com as trinta moedas, até Sam Martinho. A cada qual, o seu merecido.

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