Opinión

Galeguismo castelhanista

Na Galiza, o partido político espanhol PP afeta professar galeguismo, o qual, em rigor, caberá qualificarmos de castelhanista, como se evidencia, inter alia, no tipo de galego que aquele abraça, um galego de eñe, de icona e de Galicia, apresentado como língua menor quadriprovincial, formal e funcionalmente subordinada ao castelhano. Por outro lado, esse galeguismo castelhanista é (sinceramente) vivido e desenvolvido polo organismo que o PP decretou ser fonte de autoridade lingüística, ou seja, a RAG, e também por parte de umha constelaçom de autores, associaçons e empresas que, polo facto de utilizarem aquele modelo de galego, tenhem direito a ediçons, prémios, subsídios, benesses e presença mediática, com exclusom absoluta daquelas pessoas ou coletivos que, por julgarem o galego língua nacional de projeçom internacional, se recusam a utilizar tal galego decretal.

Esse galeguismo castelhanista aplicado ao idioma galego, quando confrontado com a realidade lingüística de contextos normalizados, tem de realizar contorçons argumentais inverossímeis para dissimular a sua radical incoerência, porque, por exemplo, aquilo que os seus aderentes admitem válido para o castelhano, a unidade lingüística e ortográfica no seio de umha enorme diversidade (cántabros, andaluzes, canários, rio-platenses, mexicanos, cubanos, etc.), o galeguismo castelhanista nom o pode aceitar para o galego-português. É, o do galeguista castelhanista, um labor argumentativo deveras difícil, porque, numha conjuntura sociocultural comprometidíssima para o galego como a atual, e frente à boa nova espalhada polo reintegracionismo, de sentido capacitante e emancipador, aquele tem de proclamar umha condiçom menor e subalterna para o nosso idioma, tem de justificar nom querer cobrar um bilhete de lotaria premiado, e explicar por que renuncia a brandir umha lança bem aguçada contra o tigre cultural que nos dilacera, preferindo abanar um vime no seu lugar.

Essa é a atitude em que, justamente, se inserem as declaraçons do editor Moisés Barcia registadas no ND do passado 6 de novembro: «Non hai dicionarios que traduzan directamente ao galego, temos que facer ponte polo castelán». Minha madrinha!, difícil encontrar melhor cifra do galeguismo castelhanista do que essa, que, num contexto de pretenso serviço ao galego, apregoa a (falsa) inferioridade do nosso idioma frente ao castelhano! Se a segunda parte dessa afirmaçom de Barcia se nos afigura assaz estranha (os tradutores de línguas «exóticas» que a sua editora emprega nom conhecem bem o inglês?, ou será que, realmente, nom traduzem das línguas estrangeiras que dim ter traduzido?), para formular a primeira parte, terá sido precisa pura cegueira, se nom obcecaçom.

Som tradutor e professor de traduçom de inglês e de alemám para galego, e podo testemunhar, através de gozosa experiência própria, que hoje o nosso idioma conta com variados e valiosos dicionários bilingues de nível profissional, mas, é claro, sempre que, livres de sectarismo (e de eventual interesse numha autolimitaçom subsidiada), nom excluamos da consangüinidade com o galego as variedades lusitana e brasileira da nossa língua. Já publiquei há uns anos, no Sermos Galiza, um artigo a explicar o grande serviço que os muitos dicionários bilingues de qualidade profissional que incorporam o português podem prestar aos utentes de galego, texto que o leitor pode recuperar digitando num motor de pesquisa «Inglês, swallow; galego-português, andorinha». Agora nom vou reiterar os exemplos aí propostos, mas si será pertinente lembrar que o recurso a tais obras lexicográficas constitui, de facto, umha ajuda inestimável para cultivarmos um galego verdadeiramente genuíno, extenso e útil. Assim, ao consultarmos esses dicionários —como, entre outros, os de inglês-português da Porto Editora e da Oxford UP, e os de alemám-português da Porto Editora e da Langenscheidt—, podemos ver que o derivado genuíno de percorrer é percurso (< al. Strecke), que a variante supradialetal galega, em contra do que a TVG insinua, nom deve ser lapa, e si chama (< ingl. flame), da qual obtemos lança-chamas (< ingl. flamethrower), que nos livra de um dúbio *lança-lapas!, e que, enfim, o eufemismo genuíno sinónimo de velho nom é, no nosso idioma, *maior, mas —toma nota, ND!— idoso (< ingl. elder).

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