Opinión

Escandalosa anomia neológica

Nesta penúltima entrega da série de artigos que dedicamos a analisar a resposta, lesiva para a nossa língua, que a RAG=ILG dá à estagnaçom pós-medieval e à correspondente suplência castelhanizante padecidas polo léxico galego, focalizamos um aspeto da codificaçom oficialista que se revela surpreendente e que tem de suscitar perplexidade em qualquer pessoa que registar com atençom os usos realizados no galego autonómico: um dos princípios codificadores declarados pola RAG=ILG na introduçom ao seu texto prescritivo fundamental, as NOMIG, demanda que a neologia seja realizada em galego de harmonia com o português, "sempre que esta adopción non for contraria ás características estruturais do galego" (!). Este princípio codificador, quarto na numeraçom empregada, e que, com pequenas variaçons na sua redaçom, sempre estivo presente, desde a primeira ediçom das NOMIG, de 1982, no documento normativo fundamental da RAG=ILG, reza assim na sua versom atual, de 2003 (pág. 12): "As escollas normativas deben ser harmónicas coas das outras linguas, especialmente coas romances en xeral e coa portuguesa en particular, evitando que o galego adopte solucións insolidárias e unilaterais naqueles aspectos comúns a todas elas. Para o arrequecemento do léxico culto, nomeadamente no referido aos ámbitos científico e técnico, o portugués será considerado recurso fundamental, sempre que esta adopción non for contraria ás características estruturais do galego".

Como é possível conciliar este princípio codificador ─portanto, diretriz de máxima categoria no estabelecimento do léxico-padrom da RAG=ILG─, que pede de forma explícita, e com critério regenerador, a coordenaçom neológica com o luso-brasileiro, com as soluçons neológicas de facto propostas no DRAG, as quais, como vimos, mesmo em detrimento da idiomaticidade e da funcionalidade, quase sempre harmonizam com o castelhano (ex.: *cerebro, *silicona) ou, nalguns casos, som fruto de umha caprichosa e antieconómica invençom (ex.: *gromo (epidémico), *icona)? Nom havendo possibilidade lógica de coadunar esse princípio codificador com a prática da RAG=ILG, só cabe concluirmos que, no seio da codificaçom oficialista do léxico galego, se verifica umha grave contradiçom, e que a praxe neológica oficialista ─em prejuízo da homologaçom do galego como língua de cultura e da sua utilidade comunicativa─ se desenvolve na anomia, à rebeldia do ditaminado no seu texto codificador fundamental.

Ora bem, esta grave contradiçom da RAG=ILG, embora constitua um dilema para os seguidores da codificaçom oficialista, nom apresenta, em absoluto, caráter de aporia, pois, como já sabemos, tem fácil e feliz soluçom, umha que acarreta para o galego a incorporaçom de unidades neológicas idiomáticas, funcionais, coerentes, económicas e vantajosas do ponto de vista sociolingüístico: a resoluta priorizaçom do princípio codificador 4.º das NOMIG, ou seja, umha coordenaçom neológica constante, com as mínimas adaptaçons que forem indispensáveis, com o léxico luso-brasileiro. Essa é a única prática lexical verdadeiramente regeneradora, também aplicável, com toda a legitimidade normativa, como vemos, no seio da codificaçom RAG=ILG, e que, para todos os utentes de galego, tem sido dignamente promovida polo Prof. Freixeiro Mato no quadro da sua valiosa proposta de lingua de calidade.

Para findarmos, queremos salientar dous pormenores espinhentos da redaçom do regenerador princípio codificador 4.º das NOMIG (2003): por um lado, o emprego nesse passo do vocábulo arrequecemento, popularismo diferencialista, em vez da forma comum com o português culto enriquecemento, parece já prenunciar a falta de adesom prática dos codificadores ao proclamado; por outro lado, a restriçom da coordenaçom neológica com o português ao "léxico culto" (com destaque para o ámbito técnico-científico), que na letra do princípio se estabelece, patenteia a escassa perspicácia analítica dos codificadores oficialistas, os quais nom tenhem em conta que os fenómenos degradativos da estagnaçom pós-medieval e da suplência castelhanizante afetam todo o léxico galego moderno (posterior ao séc. XV), e nom unicamente o seu setor culto ou especializado, com inclusom, como vimos nos ex. da peça anterior, da designaçom de conceitos quotidianos e até informais, como boiom, chumbar ou desmancha-prazeres. Eloqüente miopia!

Comentarios