Opinión

A andorinha, a vaca-loura e o patinho feio

Tendo em conta as suas origens e a sua constituiçom atual (descontadas aderências espúrias), o galego é umha das variedades nacionais do galego-português, potente língua de cultura de projeçom internacional; de acordo com a doutrina do regionalismo lingüístico da RAG=ILG, o galego é um patinho feio, umha língua quadriprovincial menor, diferente do português, subordinada formal e funcionalmente ao castelhano e desprovida da maior parte dos materiais e recursos próprios de umha língua de cultura (p. ex., dicionários bilingues de qualidade profissional). Nessa linha, a RAG=ILG apetrecha o gal. com umha ortografia de ñ (que transmuta o ninho galego-português num niño pseudocastelhano) e de xx (que transmuta o gal-port. Feijó num Feikhó pseudocast.) e com um léxico crivado de servis (e disfuncionais) castelhanismos (a sili-cona; as cobras son cobras moi velenosas; as lentes das lentes), de antieconómicas (e disfuncionais) invençons (a (emot)i-cona; engalar 'açom de um aviom descolar') e de artificiosos e empobrecedores diferencialismos (acadar, acadar, mas alcance; atopar, atopar, mas encontro).

Tivo sucesso essa conceçom isolacionista e menorizadora do gal. própria do regionalismo lingüístico, promovida polo governante nacionalismo espanhol? Infelizmente, entre a maior parte do povo, tivo, e grande. Assim é que o gal., nos últimos quarenta anos, perante a agressiva afirmaçom do cast., tem recuado de forma alarmante como língua materna e de uso habitual, ao mesmo tempo que na populaçom da Galiza ficava reforçada a associaçom do cast., idioma nacional e internacional, com o prestígio, em prejuízo do gal., apresentado pola RAG=ILG como idioma regional, peculiar, etnográfico. Vejamos aqui umha estarrecedora manifestaçom dessa lesiva atitude.

No passado 24 de setembro, a ediçom internética do ND publicava umha entrevista com Eladino Cabanelas, autor de Vacaloura, jogo de tabuleiro concebido para promover o gal., e aí o entrevistado afirmava: "As vacalouras son uns animaliños que, ademais de seren moi simpáticos, teñen un nome que non se entende fóra da Galiza, e, ademais, están en perigo de extinción, como tamén o está, por desgraza, a nosa lingua". Que terrível ignoráncia ingénua!! O autor do jogo, amigo do gal., nom sabe que a palavra vaca-loura (que designa, em geral, os escaravelhos da fam. Lucanídeos e, em particular, os da sp. Lucanus cervus), como grande parte das palavras galegas genuínas, além de em gal., também está presente nas variedades lusitana e brasileira da nossa língua, e, ainda, neste caso, como elemento dos respetivos padrons lexicais, polo que ela é utilizada —ou, polo menos, reconhecida— por um coletivo potencial de c. 250 milhons de pessoas em todo o mundo (a nível dialetal, vaca-loura designa no Brasil [onde nom vive L. cervus] outra sp. de escaravelho). Nom admira este deslize de Cabanelas: ele aqui reproduz o que os doutrinadores oficialistas disseminam. Assim, a 12 de setembro de 2003, LVG divulgava (p. 44) as seguintes palavras, proferidas por X. R. Barreiro, na altura presidente da RAG: "Non tódalas culturas teñen un idioma propio [= exclusivo?] e non tódolos idiomas teñen palabras como anduriña ou bidueiro". Que terrível ocultaçom ou ignoráncia dolosa!! O entom presidente da RAG nom sabia que andorinha e vidoeiro, além de serem vocábulos galegos, também fam parte dos padrons lexicais lusitano e brasileiro, e que, portanto, som usados por 250 milhons de pessoas?!

Ao desprezar e ocultar a unidade lingüística (e lexical) galego-portuguesa, a RAG=ILG está a renunciar ao prestigiamento social do gal. e está a privar a esmagadora maioria dos seus utentes dos materiais e recursos (luso-brasileiros) que lhes permitiriam viver em gal. como língua de cultura. À maior parte dos galaicófonos fica assim vedado o uso de dicionários bilingues profissionais, como os da Porto Editora ou os da Langenscheidt, em que a consulta de vaca-loura produz a equivalência ingl. stag-beetle e a al. Hirschkäfer; a de andorinha, a equiv. ingl. swallow e a al. Schwalbe, e a de vidoeiro, a equiv. ingl. birch e a al. Birke. Por favor, agentes oficialistas, permitam que o galego se espelhe nas límpidas águas do extenso lago luso-brasileiro e se reveja como aquilo que ele é: um belo cisne, capaz de viver, afagado polos seus congéneres, livre e em plenitude.

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