Galegos na primeira volta ao mundo (1519-1522)

Neste 7 de fevereiro a Biblioteca Nacional de Portugal abre a exposição Em demanda da biblioteca de Fernão de Magalhães. Começam oficialmente os actos do quinto centenário do início da histórica viagem de circum-navegação do globo terrestre. 

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Nos dias passados, Portugal anunciou que ia apresentar à UNESCO uma candidatura para incluir a rota de Magalhães no Património da Humanidade. Madrid reagiu com força: como se atrevia Portugal a tanto se, afinal de contas, da Espanha era o dinheiro e o porto de partida e chegada de tal odisseia. 


Um livro para dar a volta ao mundo...

A exposição centra-se na ideia das leituras de guias náuticos, roteiros, tratados geográficos e relatos de viagens em que Magalhães se deveria ter baseado antes de  rumar ao arquipélago de Maluco pela via do poente. Contudo, Magalhães não deixou grandes vestígios textuais, pois dele apenas se conhecem algumas cartas e memorandos em letra que aparenta ser de homem culto, mas que não incluem referências de natureza bibliográfica. E apenas há notícias certas de ter possuído um único livro. Itinerário de Ludouico de Barthema.

… e outro livro  para a contar

Da viagem de Magalhães levou conta Antonio Pigafetta, um académico Veneziano que nasceu em Vincenza, Itália, por volta de 1490 e que acompanhava Magalhães na viagem. Pigafetta manteve um diário detalhado, o original do qual se perdeu. No entanto, um relato da viagem, escrito por Pigafetta entre 1522 e 1525,  permaneceu em quatro versões escritas a mão: um em Italiano e três em Francês. Uma desta versões em Francês, a mais completa e mais bem produzida das quatro que sobreviveram, é a da biblioteca da Universidade de Yale. Inclui 23 mapas iluminados e lindamente desenhados. A obra de Pigafetta é importante não apenas como uma fonte de informação sobre a viagem em si, mas também inclui uma descrição inicial do povo e dos idiomas das Filipinas. 

Captura de pantalla (9)Dos aproximadamente 240 homens que se juntaram a Magalhães, Pigafetta, com apenas outros 17, conseguiu retornar a Espanha. Magalhães ele mesmo foi morto, em 27 de Abril de 1521, na batalha da Ilha de Mactan, nas Filipinas. Pigafetta testemunhou e relata nesta obra a batalha e como morre Magalhães.

E os galegos?

A informação que chegou a nós é relativamente incompleta e da tripulação de alguns barcos pouco sabemos, especialmente da do San António, que desertou e iniciou viagem de volta . Também nos é desconhecida a origem de um 12% da tripulação. Sabemos que entre os 18 que regressaram a Sevilha ao menos dois eram naturais de Baiona: Diego Gallego e Vasco Gómez Gallego. 

Mas, quantos foram os que lá partiram?  

No Libro Copiador de la armada al Maluco, transliterado por Cristobal Brernal, há uma relação dos homens que foram recebidos e ordenados a fazer a viagem para a descoberta da Especiaria. Nele figuram os nomes e sobrenomes de cada expedicionário, seus pais e esposa, ofício, lugar de origem, nascimento ou bairro, seu salário mensal e a quantidade do adiantamento de quatro meses. Alguns grumetes portugueses  tiveram de ser substituídos, uma vez que o rei tinha ordenado que  não podiam viajar mais do que quatro ou cinco com cada um dos capitães gerais. Alguns ausentaram, depois de terem recebido seu salário adiantado, montante que seria cobrado aos seus garantes.

Da relação referida no livro achamos que com Magalhães, único capitão geral, viajaram os seguintes galegos, citando literalmente e em castelhano do Libro Copiador de la armada al Maluco

-Antón de Noya, grumete, natural de Noya, que es en Galícia, hijo de Bartolomé de Baamonde y Catalina, su mujer, ha de haber de sueldo a ochocientos maravedíes por mes. Pagaronsele por sueldo de cuatro meses adelantados.

-Luis de Veas, grumete, natural de Veas, que es en Galícia, tierra del conde don Fernando de Andrada, hijo de Bartolomé González e Isabel González, ha de haber de sueldo a ochocientos maravedíes por mes. Pagaronsele por el sueldo de cuatro meses adelantados.

-Vasco Gómez Gallego, grumete, hijo de Vasco Gómez Gallego y Catalina García, vecinos de Bayona de Galícia, ha de haber de sueldo a ochocientos maravedíes por mes. Pagaronsele por sueldo de cuatro meses adelantados.

-Juan Gallego, grumete, natural de Pontevedra, hijo de Alonso Rode y María Martín, vecinos del Canto de la Barca, que es en Galícia, ha de haber de salario a ochocientos maravedíes por mes. Pagaronsele por sueldo de cuatro meses adelantados, tres mil y doscientos maravedíes.

Captura de pantalla (10)Na nave San António, com Juan de Cartagena como capitão só viajou

-Rodrigo Nieto Gallego, criado del dicho capitán, vecino de Orense, hijo de Diego Nieto y Constanza Fejo, ha de haber de sueldo a ochocientos mrs por mes. Recibió por el sueldo de cuatro meses adelantados.

Outros dois que figuram na relação (Juan Gallego e Juan de Muros) foram substituídos por dois genoveses ao se descobrir que não eram galegos mas portugueses.

Na Vitória, com Luís de Mendoza por capitão:

-Diego Gallego, marinero, natural de Bayona Mayor, que es en Galicia, hijo de Francisco de Carmona y María Pérez, vecinos de Bayona difuntos, ha de haber de sueldo a mil y doscientos maravedíes por mes. Recibió por sueldo de cuatro meses adelantados, cuatro mil y ochocientos maravedíes 

-Rodrigo Gallego, natural de la Coruña, grumete, hijo de Duarte Hernández y Beatríz Rodríguez, ha de haber de sueldo a dccc mrs por mes. Recibió por sueldo de cuatro meses adelantados.

-Gregorio de Vigo, natural de Vigo, que es en Galícia, hijo de Rodrigo Alvarez e Isabel Núñez, há de haber de sueldo a ochocientos mrs por mes. Recibió por sueldo de cuatro meses adelantados. 

-Juanes, natural de Tuy, hijo de Gonzalo Hernández e Isabel Rodríguez, ha de haber de sueldo a ochocientos mrs por mes. Recibió por sueldo de cuatro meses adelantados.

Na nave Santiago, com Juan Rodríguez Serrano por capitão, não consta nenhum galego. 

 
Mas fica bem às claras que essa primeira volta ao mundo é uma questão de livros: um, o Itinerário de Ludouico de Barthema, é mais que suficiente para sonhar com a viagem e outro, o de Pigafetta, abunda para contá-la! O terceiro, o Libro Copiador de la armada al Maluco, põe os protagonistas nesta história, entre eles os galegos.

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