UMA VISÃO DESDE ANGOLA

Enquanto Gaza arde

Disponibilizamos a seguir um muito interesante artigo da cantora e jornalista angolana Aline Frazão.

gaza

Na soma, só o zero é neutro. A neutralidade é o artifício dos cúmplices que, ao não se atreverem a condenar Israel, consentem a morte de mais uma vítima palestiniana. E os números vão-se multiplicando exponencialmente nas contas da vergonha. Neste preciso momento, passaram oito dias. Quase duzentos palestinianos morreram, maioritariamente civis [artigo publicado o dia 17 de Julho, neste momento a conta supera já os 500]. A morte de um israelita acaba de ser anunciada. Os números da guerra são sempre uma abstração fria e cruel da realidade, mas quase sempre nos dizem alguma coisa, por pequena que seja.

Calcula-se que em Gaza setenta e três por cento das crianças menores de dois anos sofrem de anemia

Passaram quarenta e sete anos e muitas vezes a Faixa de Gaza foi descrita como um autêntico campo de concentração. Ali, cerca de um milhão e meio de palestinianos sobrevivem como podem à violência e ao forte bloqueio imposto pelo estado israelita. Numa semana normal, sem bombardeamentos, Gaza é uma ferida aberta na superfície da terra. Cercada de arame farpado e de controles militares, carece de alimentos, assistência médica e de todo o tipo de infraestruturas básicas. Aquilo que os mísseis destroem em tempos de guerra não chega a ser reconstruído sem o consentimento israelita. Desde a limitação na circulação de pessoas, à detenção de palestinianos que buscam tratamento médico fora de Gaza, Israel parece não ter qualquer limite moral. Por exemplo, devido às severas restrições no abastecimento de alimentos, calcula-se que em Gaza setenta e três por cento das crianças menores de dois anos sofrem de anemia.

Ocupação ilegal

Do lado de lá, na Cisjordânia, cresce também o número de colonatos israelitas que vão avançando descaradamente. Trata-se de uma ocupação ilegal que viola a Resolução do Conselho de Segurança da ONU, mas isso não parece importar muito. Israel encontra aliados e parceiros por todo o mundo, começando pelos EUA e acabando em Angola.

Revirando os jornais, os noticiários e as redes sociais, vemos que importantes meios de comunicação e ONG insistem em afirmar que há violência de ambos os lados, segundo um paradigma de suposta neutralidade. A lavagem cerebral, dentro e fora de Israel, é do tamanho da tragédia. É evidente, e não só pelos números, que Israel é imensamente superior, militar e economicamente, e que a Palestina se limita a resistir e a reagir. Defendem pouco mais do que a própria vida, já que a terra, essa, tem-lhes sido subtraída injustamente ao longo dos anos.

Não há neutralidade inocente

A neutralidade é, portanto, insustentável. Não é possível tratar os dois lados como iguais com tamanha desproporcionalidade de forças. Neutralidade é aqui sinónimo de cumplicidade com os principais agressores, com Israel. Não há neutralidade inocente nem silêncio que não esconda interesses combinados a voz baixa nos bastidores da macroeconomia.

Enquanto Gaza arde, lembramos o apartheid na África do Sul. Lembramos o genocídio no Ruanda. Lembramos o Holocausto. E assim a História se vai escrevendo e apagando, entre as somas e as perdas, entre a ironia e a amnésia. E de neutra não tem nem uma linha.

Artigo tirado de RedeAngola.Info

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