''Podemos afirmar que por volta da língua não há nada parecido a um consenso''

Conversamos con Arturo de Nieves, sociólogo e co-autor do livro Galego, português, galego-português, editado por ATravés

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Arturo de Nieves é, junto a Carlos Taibo, o autor de Galego, português, galego-português, editado por ATravés. Com ele analisamos as respostas que 56 figuras da cultura galega dão a respeito da condição da ortografía oficial ou de qual deve ser a relação da Galiza com a lusofonia. Aliás, fazemos-lhe a ele as três perguntas que os dois autores puseram riba da mesa para a redacção desta obra. Correspondem com as três primeiras desta entrevista.

Pensa você que a ortografía do galego é a ajeitada ou estima que seria preferível empregar outra diferente?

Seria preferível empregar outra diferente e por vários motivos. Em primeiro lugar porque a ortografía aprovada em 2003 utiliza como padrão normativizador a norma do espanhol, que é a língua de interferência, e isto depaupera a qualidade do idioma.

"Ainda que doa dizê-lo, penso que as subvenções funcionam como um mecanismo de divisão no campo cultural galego"

Porém, tem consequências também a nível sociolingüístico porque se reconstrói a hexemonía da língua espanhola sobre a galega. Portanto, considero que deveria adoptar-se o acordo ortográfico da lusofonia, que é o padrão comum do galego no Mundo.

Pensa que galego e português são duas línguas diferentes ou bem são a mesma?

Remeto-me a Carvalho Calero e digo que são codialetos dum diassistema linguístico, da mesma maneira que podemos dizer que um australiano fala a mesma língua que um escocês. São variantes de uma mesma língua, ainda que cada uma com o seu sotaque e com as suas variações.

Cual pensa que devera ser a relação da Galiza com a lusofonia?

Bem mais intensa do que é hoje em dia. Tem muitas vantagens não só no âmbito económico, que aqui são já evidentes, mas também a nível cultural, de intercâmbio universitário; seria muito interessante, e também num sentido mais amplo, introduzir oferta cultural lusófona ou portuguesa na Galiza para capacitar a população galega a entrar em contacto com essa outra variante internacional.

"Esta normativa oficial é consecuencia da nosa derrota histórica". É uma afirmação que aparece no livro e que está escrita nessa normativa oficial. Há mais pessoas que a empregam malia manifestar-se contrárias a ela. Por que?

Eu o único que posso fazer sobre esta questão é especular e nesse sentido, ainda que doa dizê-lo, penso que as subvenções funcionaram (em passado) como um mecanismo de divisão no campo cultural galego, por considerar subvencionáveis só os textos redigidos na chamada normativa oficial. O que aconteceu historicamente no galeguismo é que havia pluralidade no uso da norma e não havia nenhum tipo de exclusão. Acho que as subvenções o que fizeram foi fomentar que a norma habitual fora a mal chamada oficial. O efeito foi perverso. 

"O sistema educativo tem que servir para pôr em valor a competência numa língua de uso internacional"

E bon, suponho também que muitos autores queriam publicar e não tinham mais remédio que o fazer na norma ILG. Também isto é criticável porque há outros autores, como Carlos Quiroga, que publicou há pouco em Portugal e distribuíram a sua obra com um jornal português, que manteve uma praxe de escrita no acordo ortográfico e isso não impediu que a sua obra se desse a conhecer. 

Para além do debate de normas, estamos diante de um problema sociolingüístico e de uma desafeção no uso da nossa língua que é maior nas mulheres. Por que há tantos homens opinando neste livro? Elas são exactamente a quarta parte.

(ri) A responsabilidade aqui sim que é inteiramente nossa. Assumimos a culpa. Não sei a relação de homens e mulheres porque o nosso inquérito inicial contemplava mais questionários e, se bem inicialmente a relação era mais equitativa, esta viu-se alterada polo facto de não todas as pessoas inquiridas terem decidido colaborar. Estivemos um ano inteiro pressionando para que a gente nos respondesse e isto foi o que conseguimos. Mas sim, seria interessante que fosse maior a presença de mulheres opinando. 

No prólogo fazeis fincapé em que @s responsáveis polític@s se abstiverom de responder. 

Diria que continua a ser este um tema polémico e, de alguma maneira, posicionarse sobre esta questão ainda resulta arriscado. E é preciso contemplar também a possibilidade de que não tenham uma posição formada sobre esta matéria. 

Quais são as dificuldades de editar ou de aceder a livros da lusofonia na Galiza?

Penso que com internet há que relativizar muito porque o acesso aos conteúdos há. É mais bem um problema de socialização e do sistema educativo. Eu eduquei-me num centro galego e a visão que se dá do português é a de uma língua estrangeira com a que não temos mais relação que a lírica medieval. O sistema educativo tem de servir para pôr em valor as potencialidades do estudantado. Neste caso, uma potencialidade evidente dos galegos é que temos competência numa língua de uso internacional. 

"A minha utopia não seria tanto que os reintegracionaistas chegáramos à hexemonía; o que quero é que se abra o debate civilizado sobre esta questão"

O epílogo que achegam é descritivo das respostas. Gostaria de saber que conclusão tira você desta experiência. 

Penso que a maior parte dos discursos que existem sobre a língua estão presentes no livro. Uma das conclusões importantes para mim seria que podemos afirmar que não há nada parecido a um consenso. É um tema aberto e as pessoas que são a favor ou em contra da norma oficial empregam muitas vezes o mesmo argumento para a defender ou para a atacar, por exemplo, as raízes históricas ou etimolóxicas. 

A minha utopia não seria tanto que os reintegracionaistas chegásemos à hexemonía sobre esta questão. Eu não me importo tanto que não se discuta que galego e português são a mesma língua e que todo mundo empregue o acordo ortográfico. O que quero é que se abra o debate civilizado sobre esta questão, fugindo de um passado bastante triste e de linhas divisórias entre pessoas que no final estão na mesma coisa: a defesa da língua.

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