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Crônica desde o Donbass: Ucrânia ataca hotel onde estão alojados jornalistas

Na manhã de onte, a artilharia ucraniana atingiu o Donbass Palace, um dos principais lugares escolhidos pelos jornalistas e diplomatas para dormir e trabalhar.
Estado em que ficou o interior do hotel Donbass Palace, onde dormen habitualmente jornalistas e diplomatas. (Foto: Bruno Carvalho)
photo_camera Estado em que ficou o interior do hotel Donbass Palace, onde dormen habitualmente jornalistas e diplomatas. (Foto: Bruno Carvalho)

Vários jornalistas foram apanhados de surpresa dentro do Donbass Palace quando este hotel foi bombardeado pelas forças ucranianas, em Donetsk, na manhã de quinta-feira. Fortes explosões atingiram o centro da maior das cidades do Donbass num ataque inesperado que deixou seis mortos e vários feridos. Qualquer jornalista que trabalhe em Donetsk sabe que é no bar deste hotel que se encontra a melhor conexão para enviar material audiovisual mais pesado. O emblemático edifício de 1938 chegou a ser ocupado pela Gestapo quando a cidade esteve sob o controlo das tropas nazis e é hoje a unidade hoteleira mais conhecida da região.

Em frente ao hotel, morreu uma mulher que caminhava na rua quando ocorreu o ataque. O lobby ficou parcialmente destruído e dezenas de quartos foram atingidos pela onda expansiva da explosão. A jornalista canadiana Eva Bartlett contou que estava no seu quarto e que por volta das 10.10 ouviu um rebentamento e considerou que este ataque "estava dirigido contra os jornalistas".

Enquanto fazíamos a cobertura da parte de fora do edifício, um novo ataque obrigou os jornalistas a resguardarem-se dentro do hotel. A poucas dezenas de metros, no Boulevard Pushkin, uma zona pedonal com muitos cafés e restaurantes, duas fortes explosões provocaram mais cinco mortos, entre os quais uma mulher e a sua filha menor.

Também não muito longe dali, o Teatro Drama, onde se realizavam as cerimónias fúnebres de Olga Kachura, uma coronel pró-russa morta no dia anterior em Gorlovka, também foi objetivo da artilharia pesada. Este facto torna ainda menos credível a versão das autoridades ucranianas de que foram os próprios russos os responsáveis por estes ataques. Entre os muitos jornalistas hospedados neste hotel há vários russos e o funeral reuniu militares russos e locais. Não é sequer plausível que os serviços da inteligência ucraniana não soubessem o que todos na cidade sabem: os jornalistas estão concentrados no Donbass Palace e no Hotel Central.

O hotel após o ataque. (Foto: Bruno Carvalho)
O hotel após o ataque. (Foto: Bruno Carvalho)

Centenas de minas anti-pessoais em Donetsk

Nas últimas semanas, a guerra tem subido de tom no Donbass com o avanço no terreno das tropas russas e das mílicias locais em lugares como Avdeevka, Peski e Maryanka. Durante anos, estas localidades foram bastiões militares das forças ucranianas e estão agora em perigo. Uma derrota aqui suporia uma importante vitória da Rússia e mílicias locais que já puseram o fim do mês de agosto como meta para controlar toda a região do Donbass.

Mas muita da guerra faz-se com a artilharia pesada. Ainda que não se perceba qual o objetivo militar de atacar zonas residenciais, a Ucrânia voltou, no sábado, a lançar um bombardeamento sobre vários pontos da cidade de Donetsk. Este ataque lançou centenas de pequenas minas anti-pessoais PFM-1 dentro de projécteis. Este tipo de dispositivo armadilhado de fabrico soviético tem o tamanho de uma mão e é capaz de ferir gravemente quem o pise ou tente manusear. Várias ruas e avenidas tiveram de ser fechadas ao trânsito para que as equipas de especialistas pudessem fazer explodir estas minas. Contudo, desde sábado, pelo menos 17 pessoas ficaram feridas depois de pisarem estes dispositivos.

De noite, a cidade está deserta devido à má iluminação e à dificuldade em detetar este tipo de minas. Entretanto, fortes tempestades, esta semana, provocaram inundações e arrastaram muitas destas minas para zonas da cidade que tinham sido já alvo de limpeza.

É uma situação cada vez mais difícil numa cidade submetida a sucessivos cortes de água e falhas na eletricidade, onde a população desespera por ver uma saída rápida que conduza à paz.

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