Desenvolvimento alternativo ou alternativas ao desenvolvimento?

A capacidade tecnológica atual permite garantir condições de vida dignas para toda a humanidade. O problema da pobreza deriva do capitalismo, sistema global predominante como mecanismo regulador da produção e distribuição dos bens e serviços a nível coletivo. Como resposta aos excessos do economicismo neoclássico surgem, na última década do século XX, duas correntes paradigmáticas para acometer a questão do desenvolvimento. A primeira, artelhada arredor da Comissão do Sul de1987 no âmbito do Movimento dos Países Não Alinhados, recolhe interpretações dependentistas, estruturalistas e neomarxistas e autorresponsabiliza aos países subdesenvolvidos pela definição de um plano de ação,que baseado na sua própria cooperação,seja capaz de enfrentar o domínio do Norte e alterar a ordem mundial para estabelecer novas relações de interdependência Norte-Sul. Frente a esta teoria econômica holística e reassumindo a idéia das “necessidades básicas”, auspiciada pelo Banco Mundial e a OIT, é que se perfila desde o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, uma nova interpretação alcunhada como “desenvolvimento humano”,que situa o indivíduo como sujeito e destino deste processo,visando ampliar as suas capacidades e oportunidades para desenrolar com dignidade o seu projeto vital, mas a risco de desmembrar o desenvolvimento da sua dimensão material. O seu contributo principal foi a elaboração do Índice de Desenvolvimento Humano, que complementa a significância da “renda per capita”. Eliminar a discriminação e a pobreza As duas perspectivas coincidem na sua multidimensionalidade, achegando elementos sociais e políticos a este novo objeto de estudo da economia. Aliás, a Comissão do Sul adota um caráter normativo em prol dum desenvolvimento desde e para o coletivo, advogando pela libertação política individual e nacional, e por um crescimento econômico ajustado a parâmetros ambientais e de justiça social para eliminar a discriminação e a pobreza. Transitando através de posteriores aportes como a atualização neoestruturalista da articulação “centro periferia” de autores da CEPAL como Armando Di Filippo; o paradigma do desenvolvimento endógeno e local;o desenvolvimentismo sustentável; os aspectos de gênero; a contra-revolução neoclássica e a moderada reforma superadora do convencional consenso de Washington proposta por Stiglitz no 2000 ou a Agenda de Barcelona de 2004, chegamos a Porto Alegre. Nas sucessivas edições do Fórum Social Mundial, e desde posturas heterogêneas, estabelecem-se uma série de elementos comuns que responsabilizam os países desenvolvidos por travar o desenvolvimento dos periféricos, propugnando modelos autocentrados, retomando a crítica às políticas da OMC e clamando justiça global mediante uma fiscalidade internacional e a anulação da dívida externa. Porém, ressaltam apenas o “neoliberalismo” como causa do subdesenvolvimento, alentando a esperança dum capitalismo benigno. O anti-desenvolvimentismo O anti-desenvolvimentismo, dicotômico e excluinte, chega a equiparar o conceito de desenvolvimento com o crescimento capitalista, invalidando a possibilidade dum desenvolvimento alternativo. E fraqueja, tanto na sua fundamentação teórica quanto no seu suporte propositivo como alternativa emancipatória, precipitando-se em arranjo acomodadiço, inócuo ante a hegemonia capitalista, por que reconduz a necessidade de transformação para uma mistura de dinâmicas dispersas, órfãs de propósito firme e perceptível, circunstância celebrada e ecoada desde os alto-falantes mediáticos como única alternativa ao mainstream. Conforme ao professor Ramírez-Cendrero destacamos, entre as pertinentes críticas ao pós-desenvolvimentismo, uma frágil interpretação dos aspetos centrais do processo capitalista a nível mundial;ausência analítica a respeito das classes sociais e a exploração; falta de definição de um sujeito coletivo transformador, pois o apelo a soluções particularistas reforça o individualismo burguês e urbano do ocidentalismo que tenciona criticar, e a idealização das sociedades tradicionais obvia o seu, noutrora, caráter contraditório. O anti-desenvolvimentismo chega a equiparar o conceito de desenvolvimento com o capitalismo, invalidando a possibilidade de alternativas Aliás, será capaz de resolver as assimetrias do desenvolvimento desigual e a dependência, sem questionar o cerne da acumulação capitalista, expansiva a escala mundial? O seu radicalismo “anticapitalista” não tem gerado um corpus conceptual propiciatório de uma alternativa sistémica ao capitalismo. Apenas oferece caminhos desconexos e respostas particularistas, que simplesmente lavram uma nova fábula, isenta de soluções emancipatórias ante um subdesenvolvimento que nega por princípio. E reduz o alcanço dos seus objetivos, em quanto renega do reconhecimento da existência de certas necessidades humanas básicas e universais,que precisamente, conformam a idéia de desenvolvimento. Como assinalava a Comissão do Sul, graças à idéia de desenvolvimento é que a independência política cobra todo o seu significado. Nem tão difícil quanto necessária, pois outro desenvolvimento é possível para Galiza, como advertia o doutor Ramom López-Suevos em 1990.