Contracultura

Borxa Colmenero: "A ideia última seria abrir a possibilidade de criar uma espécie de estudos emancipatórios galegos"

Borxa Colmenero (1984, Vilar de Santos) é doutor em Direito e autor de, entre outras obras, o ensaio 'Vidas culpábeis'. O controlo neoliberal do crime (Laiovento, 2017). Porém, nesta ocasião fala com 'Nós Diario' no nome do Clara Corbelhe, uma iniciativa ambiciosa que combina uma multitude de nomes de pessoas vinculadas aos estudos académicos e o ativismo social desde distintos campos. Clara Corbelhe é un projeto de carácter coletivo e multiforme (na rede: claracorbelhe.gal).
O doutor em Direito e escritor Borxa Colmenero. (Foto: Agal)
photo_camera O doutor em Direito e escritor Borxa Colmenero. (Foto: Agal)

—Em que consiste Clara Corbelhe?
Nasce como um espaço de produção e crítica do pensamento galego, fundamentalmente para abordar as transformações sociais, económicas e políticas do pais que pensamos que não foram tratadas de forma suficientemente profunda desde a esquerda hegemônica ou desde o nacionalismo. Não nos centramos totalmente numa óptica marxista e bebemos muito dos estudos pós-coloniais, que entendemos que dão uma imagem do tecido social mais completa.

A ideia última seria abrir a possibilidade de criar uma espécie de estudos emancipatórios galegos. Configuramo-nos juridicamente, em primeiro lugar, como um espaço social, tomando a ideia das escolas de pensamento. Porém, não nos limitamos à questão académica: tratamos de posicionar-nos entre a militância intelectual e o intelectualismo militante, com a vista sempre no ativismo social.

—E quais são as atividades que realizam?
Organizamo-nos a traves de várias atividades. Por uma parte podemos falar da revista, que é um monográfico anual, do que estamos a preparar já o segundo volume. Aparecerá a finais de ano e vamos abordar os blocos ideológicos, as instituições culturais e a intelectualidade na Galiza. Algo que queremos fazer é trabalhar como pequenos projetos de investigação, não só no plano teórico, senão também produzindo entrevistas, estudo de fontes… mas criando pequenas investigações originais. Por outra parte, também temos um blogue num formato mais acessível e menos denso que tratamos de atualizar cada quinze dias sem renunciar por isso a um contido rigoroso.

Podemos adiantar também que a partir de setembro abriremos uma Área de Estudos, nessa data teremos a I Jornada de Estudo Clara Corbelhe no Paço da Cultura de Ponte Vedra. Queremos tratar a questão do progresso, da Galiza na era pós-global e também pensarmos a colonialidade no marco das novas subjetividades neoliberais. Este verão também continuamos apresentando a revista e estaremos em citas como o Festigal com os nossos materiais.

—Como é o pensamento crítico na Galiza? Notavam a falta de algo?
Pensamos que na Galiza há pensamento crítico de qualidade, mas muitas vezes circunscrito ao ámbito universitário e muito limitado por esse contexto. Também o há no ámbito militante, mas nesse caso a través de publicações informais, de blogues… Uma das nossas intenções é sistematizar o que há, fazer uma recolha e dar-lhe um marco comum a estas duas realidades que às vezes non chegam a conectar. Por isso reparamos tanto no aspecto formal: por exemplo, a nossa revista está reconhecida e tem isbn electrónico, ao igual que registramos outros aspectos da associação, tal e como figura na nossa web. Foi uma surpresa a acolhida inicial que tivemos de muitas pessoas que estavam a pensar o mesmo desde espaços e linhas muito heterodoxas.

Em pouco tempo tínhamos um cronograma para quase o primeiro ano de publicações. Sentimos que pulsáramos uma tecla.

—Quem era realmente Clara Corbelhe?
Era alguém que fazia parte do coletivo de caseteiras (camareiras ou jornaleiras, segundo a zona): eram mulheres que foram expulsas da coletividade, muitas vezes depois de sofrer violência. Porém, eram encarregadas também de trabalhos que eram necessários para a própria comunidade e viviam em grupos autónomos com muita relação com os bens e os espaços comunais. Clara Corbelhe em concreto é uma caseteira que aparece no trabalho do antropólogo José María Cardesín: quedou grávida e atreveu-se a demandar ao homem que o fizera para que lhe reconhecesse a criança. Perdeu o juízo mas deixou o rastro do seu nome. Para nós é uma metáfora do valor que, ganhemos ou não, devemos ter para a questionar a normalidade.

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