ENTREVISTA COLECTIVA AO ESPAZO ABERTO ANTIMILITAR

“Quer-se criar um complexo militar-industrial como o estadunidense”

Son testemuño da loita do movemento antimilitarista en Galiza. No A Fondo desta semana (disponíbel aquí) sobre o exército, entrevista ao Espazo Aberto Antimilitar.

capa entrevista A Fondo

-Desde que foi eliminado o serviço militar obrigatório, a presença social do discurso antimilitarista parece ter minguado. Deixou de ter sentido?

-O discurso antimilitar clássico perdeu força, mas nunca deixou de ter sentido. Continuamos a viver num mundo muito militarizado e o estado espanhol é um bom exemplo. Em 2014 era a sétima potência mundial em exportações de armamento. Tem um gasto militar excessivo, acabando por ser com frequência o triplo ou o quádruplo do orçamentado. É membro ativo da OTAN e aposta por uma política internacional claramente intervencionista.

Não podemos esquecer o papel militar no interior do estado: existem amplos territórios totalmente militarizados. O exército é o segundo proprietário de terras a nível estatal, em muitos casos para a especulação imobiliária, e na Galiza continua a ocupar terrenos em mão-comum. Com a Unidad Militar de Emergencias a presença do exército estende-se cada vez mais em âmbitos anteriormente civis. A Guardia Civil, corpo paramilitar, continua operando e a polícia cada vez está mais militarizada. O militarismo e os seus “valores” de autoritarismo, hierarquização, obediência e controlo impregnam as novas leis repressivas e de controlo social que se estão a impor.

-A "guerra contra o terrorismo" é útil para justificar essa despesa militar excessiva?

-É claro que sim. Mas a sua importância vai muito além. Serve para justificar a militarização de cidades e vias de comunicação, o controlo social e a desaparição do respeito aos direitos humanos, não apenas com intervenções diretas, mas com a ferramenta mais importante de controlo: o medo.

“O estado espanhol era, em 2014, era a sétima potência mundial em exportações de armamento.”

-Por isso defendeis a insubmissão fiscal à despesa militar. Qual a sua importância?

-A objeção fiscal, quantitativamente, tem pouco peso na Galiza. Na campanha de 2014 registramos 14 objeções, que representaram una tentativa de desvio de 1.472 euros de despesas militares para despesas sociais. Mas, em qualquer caso, é um exercício de desobediência civil e uma praxe antimilitarista legítima. As campanhas para a objeção fiscal continuam a ser uma ferramenta para mantermos presente o discurso antimilitarista na sociedade e mostrarmos alternativas que ajudam a defender os interesses reais da sociedade e das pessoas.

- Tem-se associado as forças armadas com importantes tramas de corrupção...

-Recentemente saíram à luz denúncias por parte de alguns militares que se somam às que desde os coletivos antimilitaristas se levam fazendo há anos: relações de políticos com empresas às que se adjudicam contratos milionários, compras de materiais desnecessários e obsoletos, aumento de custos, etc.

-As portas giratórias também existem no mundo militar, em particular na indústria associada.

-Não é que também existam. Trata-se de facto de um dos espaços em que mais giram, sendo Pedro Morenés um dos melhores exemplos. Foi secretário de Estado de Defesa no governo Aznar. Por causa das suas decisões, continuadas polos seus sucessores, a dívida do estado com a indústria militar espanhola elevou-se até aos trinta mil milhões. Depois de ocupar mais outros cargos políticos passou a ser conselheiro e depois diretor geral de Instalaza, empresa para a fabricação e venda de mísseis e bombas de fragmentação; e voltou ao governo como ministro de defesa, cargo que ocupa hoje. Entre as suas prioridades está a criação do “polo” militar-industrial espanhol, reforçando a interconexão entre indústria militar e estado seguindo o modelo estadunidense do “complexo militar-industrial”.

"Entre as prioridades de Pedro Morenés está a criação do “polo” militar-industrial espanhol, reforçando a interconexão entre indústria militar e estado"

-Que importância tem esta indústria na Galiza?

-Um informe do Centre Delàs de 2013 inclui uma dúzia de empresas, algumas dedicadas totalmente à indústria militar, como era Santa Bárbara, e outras que a combinam com a produção civil. Encontramos desde empresas de tecnologias da informação como Zentis; às de tecnologia aeroespacial como Tekplus; URO, que fabrica veículos blindados; ou Rodman e Navantia no âmbito da construção naval.

-No entanto, algumas vozes supostamente antimilitaristas justificaram a necessidade e continuidade destas indústrias como fonte de emprego.

-O emprego tem-se convertido na pedra filosofal que justifica qualquer barbaridade, desde a destruição ambiental até à invasão dum país. Que a criação de emprego seja atualmente a principal reivindicação sindical e das auto-designadas forças da esquerda dá ideia da desfeita social em que nos encontramos. Mas nenhuma voz que justifique a existência da indústria militar pode ser qualificada como antimilitarista.

-Nos últimos anos tem-se falado muito dos drones na Galiza.

-O drone não deixa de ser um “refinamento” da maquinaria bélica e um elemento mais na banalização da guerra. Agora, o piloto de combate pode almoçar com a família, levar as filhas à escola e depois ir salvaguardar os interesses patriótico-empresariais do momento, comodamente sentado, com total segurança. A única diferença com o jogo eletrónico é que os “gráficos” são reais. Conciliação total da vida militar com a civil, mesmo em combate, polo menos para uma elite, é claro. Avançamos na direção de uma guerra plenamente automatizada.

Um drone pode ter usos para além do militar ou do controlo social, isso indica que o complexo industrial-militar apostará polo uso civil, isto é, por ampliar o negócio.

Máis en COMUNIDADE SERMOS
Comentarios